A
Organização Mundial da Saúde (OMS) disse nesta terça-feira (9) que pessoas
assintomáticas transmitem coronavírus – "a questão é saber quanto",
segundo a entidade. O esclarecimento foi feito um dia depois de a chefe do
programa de emergências da entidade, Maria van Kerkhove, declarar que parece
ser "rara" a transmissão da Covid-19 por pacientes sem sintomas da
doença.
Maria van Kerkhove, chefe do programa de emergências da Organização Mundial da Saúde, em transmissão nesta terça-feira, 9 de junho — Foto: Reprodução/OMS
"Estamos
absolutamente convencidos de que a transmissão por casos assintomáticos está
ocorrendo, a questão é saber quanto", disse nesta terça o diretor de
emergências da OMS, Michael Ryan.
Kerkhove
também voltou a se pronunciar nesta terça. Ela disse que recebeu "muitas
mensagens da noite para o dia" e que achou importante esclarecer o
mal-entendido. Também explicou que as pesquisas estão em andamento.
"A
maioria das transmissões que conhecemos ocorre por pessoas com sintomas que
transmitem o vírus por meio de gotículas infectadas. Mas há um subconjunto de
pessoas que não desenvolvem sintomas", afirmou.
"Para
realmente entender quantas pessoas não têm [os sintomas], pois ainda não temos
essa resposta, existem algumas estimativas. Elas sugerem que entre 6% e 41% da
população podem estar com o vírus, mas não apresentar os sintomas."
Maria
van Kerkhove completou: "Acho que é um mal-entendido afirmar que uma
transmissão assintomática globalmente é muito rara, sendo que eu estava me
referindo a um subconjunto de estudos. Também me referi a alguns dados que
ainda não foram publicados, e essas são as informações que recebemos de nossos
Estados-Membros".
Ao
analisar o tema nesta segunda-feira, Kerkhove citava dados de países com grande
capacidade de testagem e rastreio. Além disso, ela disse que, em alguns casos,
quando uma segunda análise dos supostos casos assintomáticos é feita,
descobre-se que os pacientes tiveram, na verdade, leves sintomas da infecção.
Em
entrevista à GloboNews (assista ao vídeo acima), o biólogo Atila Iamarino disse
que "é uma colocação muito infeliz e muito tirada de contexto por parte da
OMS".
"A
recomendação deles de cuidado das pessoas e de distanciamento social continua
sendo a mesma. Nós não sabemos quem vai manifestar ou não os sintomas, quando
as pessoas vão transmitir o vírus, por isso todo mundo precisa continuar usando
máscara e mantendo o distanciamento social", disse Iamarino.
"Eles
[OMS] estavam falando sobre o rastreio de contatos. Que é fazer uma coisa que o
Brasil tem feito muito pouco, que é você ter uma equipe de pessoas dedicadas
para quando alguém aparece com sintomas no hospital ou em algum teste, você
rastrear os contatos dessas pessoas (...) para ver quem mais tem Covid-19
naquela região"
"Nesse
sentido, o que a OMS queria dizer com esse pronunciamento é que nesse rastreio,
o principal contágio, a principal transmissão, que vale a pena ser investigada,
é a transmissão dos casos sintomáticos".
A
declaração da chefe do programa de emergências foi criticada por pesquisadores
por ter soado ambígua. Entre os críticos que ajudaram a esclarecer o
pronunciamento esteve o diretor do Instituto de Saúde Global da Universidade de
Harvard, Ashish K. Jha.
O
pesquisador da universidade norte-americana argumentou no Twitter que
infectados que não apresentam sintomas são uma forma importante para a
transmissão da Covid-19. Ele explicou que apenas 20% dos infectados não
desenvolverão nenhum sintoma. Os outros 80% poderão desenvolver sintomas leves
ou mais duros da doença.
"Muitos
deles já espalham o vírus antes de desenvolver sintomas", disse Jha.
"Eles são, tecnicamente, pré-sintomáticos e não assintomáticos."
O
pesquisador de Harvard ponderou que a OMS diferencia os dois casos e ressaltou
que há mais casos de indivíduos pré-sintomáticos do que de assintomáticos.
Assintomáticos
x pré-sintomáticos
Uma
pessoa com o Sars CoV-2 assintomática nunca deverá desenvolver os sintomas da
Covid-19, sendo que os mais comuns são febre, tosse e dificuldade para
respirar. Um paciente pré-sintomático também está com o vírus em circulação no
corpo, mas no período de incubação, prestes a desenvolver os sintomas dentro de
alguns dias.
Natália
Pasternak, bióloga formada pela Universidade de São Paulo (USP), PhD com
pós-doutorado em Microbiologia, também esclareceu este ponto em comentário. Ela
diz que "assintomáticos são aqueles que testam positivo, mas nunca chegam
a desenvolver os sintomas. E como sabemos disso? Porque os testamos repetidas
vezes, eles continuam positivos, mas sem sintomas".
"Tem
também aquelas pessoas com sintomas leves, mas que não correlacionam isso com
doença, e como sintoma é subjetivo, já viu a confusão que isso pode causar.
Então, primeiro já fica obvio que não é tão simples assim determinar quem é
pré-sintomático ou com sintomas muito leves".
"Outra
coisa importante: os pré-sintomáticos transmitem antes e durante os sintomas, e
os sintomáticos leves transmitem o tempo todo sem perceber. E os
assintomáticos? Não sabemos!", completou.
A
pneumologista e pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Margareth Dalcomo
também falou sobre o assunto em entrevista à Globo News (assista ao vídeo
acima).
"Atrelar
esta informação dada hoje pela OMS que pode ser revista daqui a 48 horas, dado
que os estudos estão sendo feitos, a uma abertura generalizada das coisas, isso
é imprudente. Muito imprudente. É uma interpretação que eu diria precipitada,
no mínimo. Não pode ser atrelada uma coisa a outra", disse a cientista.
Dalcomo
diz que uma coisa é um "estudo científico de comunidade, um estudo
imunológico que vai estudar grupos de pessoas e vai publicar para que nós
possamos entender e revisar. Outra coisa é fazer disso, uma decisão de natureza
administrativa".
Estudos
ainda a caminho
O
que Maria van Kerkhove estava tentando explicar era justamente este ponto ainda
em estudo, o que ainda não sabemos. Como funciona a transmissão de pacientes
que nunca irão desenvolver os sintomas? O ponto importante de entender é que as
pessoas com Covid-19 ainda no início da infecção, em fase pré-sintomática, são
capazes de passar o vírus para outras pessoas.
Horas
depois da declaração, em seu perfil no Twitter, Kerkhove reforçou justamento
que há essa diferença entre pacientes assintomáticos e pré-sintomáticos. Além
disso ela recomendou a consulta ao guia da OMS publicado na sexta (5), que
trata do uso de máscaras para a proteção.
No
documento, a entidade diz que "estudos mais abrangentes sobre a
transmissão de indivíduos assintomáticos são difíceis de conduzir", mas
cita um trabalho como exemplo. A pesquisa aponta que, entre 63 indivíduos
assintomáticos estudados na China, havia evidências de que 9 (14%) infectaram
outra pessoa.
No
mesmo documento, a OMS alerta: "Os dados disponíveis até o momento, que
tratam de casos de infecção em pessoas sem sintomas são decorrentes de um número
limitado de estudos com pequenas amostras que estão sujeitas a revisões e não
podem dizer se eles carregam a transmissão."
Fonte: G1
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