Em comunicado oficial, o governo negou hoje, com veemência, a existência da campanha "O Brasil não pode parar". A ação publicitária surgiu nos bastidores do Planalto para, alinhada à postura do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), incentivar a população a encerrar o isolamento social necessário ao combate da pandemia do coronavírus.
Nesta manhã, a Justiça Federal do Rio informou ter acatado um pedido do MPF (Ministério Público Federa) para barrar a veiculação de qualquer peça publicitária com a mensagem pretendida pelo governo. A decisão, em caráter liminar, considera que a campanha põe em risco a saúde da população e que sua adoção pode resultar em colapso da rede de saúde.
Em resposta, a Secom (Secretaria Especial de Comunicação do Planalto) informou que, "definitivamente, não existe campanha publicitária ou peça oficial intitulada 'O Brasil não pode parar'. Trata-se uma mentira, uma fake news divulgada por determinados veículos de comunicação.".
A negativa pública, tática constante da chefia do Executivo federal, ocorre três dias depois que a própria Secom postou em sua conta no Instagram uma das artes elaboradas para a campanha. A publicação, que foi posteriormente apagada pelo governo, trazia a hashtag #OBrasilNãoPodeParar. No mercado de publicidade digital, a introdução de uma hashtag costuma marcar o início de uma ação de marketing.
O conteúdo foi excluído entre a noite de ontem (27) e a manhã de hoje (28), período em que a Justiça fluminense deferiu a liminar —a decisão foi tomada no plantão judiciário pela juíza federal Laura Bastos Carvalho.
Na tentativa de dar luz às teses de Bolsonaro, o texto que acompanhava a arte chamava os brasileiros a refletir que, "no mundo todo, são raros os casos de vítimas fatais do coronavírus entre jovens e adultos". "A quase-totalidade dos óbitos se deu com idosos. Portanto, é preciso proteger estas pessoas e todos os integrantes dos grupos de risco, com todo cuidado, carinho e respeito. Para estes, o isolamento."
Na contramão das autoridades de saúde em todo o planeta, Bolsonaro tem defendido o isolamento restrito a idosos e pessoas que fazem parte dos chamados grupos de risco —o que ele chama de "isolamento vertical".
Ideia semelhante foi adotada em Milão e acabou expondo ainda mais a população da cidade italiana. Essa semana, o prefeito Giuseppe Sala admitiu o erro, desculpou-se publicamente e justificou: "Naquele momento ninguém entendeu a veemência do vírus."
Vídeo
Na reação à liminar concedida pela Justiça Federal do Rio, o governo ignora a arte que havia sido publicada (e depois apagada) no Instagram. Argumenta que não houve "veiculação em qualquer canal oficial do governo".
"Não há qualquer veiculação em qualquer canal oficial do Governo Federal a respeito de vídeos ou outras peças sobre a suposta campanha. Sendo assim, obviamente, não há qualquer gasto ou custo para a Secom, já que a campanha não existe". Nota da Secretaria Especial de Comunicação do Planalto.
No entanto, além do post no Instagram, circulou pelas redes um vídeo produzido para a campanha. Em versão preliminar, o material foi compartilhado via WhatsApp por pessoas próximas ao presidente. O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho de Bolsonaro, fez uma divulgação oficial em sua página no Facebook.
O vídeo, que ainda está disponível na rede social de Flávio, tem cerca de 90 segundos e traz uma colagem de imagens com uma narração em off. Cita trabalhadores e setores da economia que, na visão do governo, serão prejudicados pelo isolamento social em resposta ao coronavírus.
"Para quem defende a vida dos brasileiros e as condições para que todos vivam com qualidade, saúde e dignidade, o Brasil definitivamente não pode parar", afirma o vídeo em seu encerramento.
O próprio chefe da Secom, Fábio Wajngarten, foi contaminado pela covid-19 durante a viagem com a comitiva presidencial para os Estados Unidos, no início de março. Ele cumpriu o isolamento social, criticado pela campanha elaborada pelo órgão que comanda. Além de Wajngarten, outras 24 pessoas que participaram da visita ao lado do presidente contraíram o coronavírus.
MPF quer suspensão de campanha em redes sociais
A pedido do MPF, a Justiça proibiu a divulgação da campanha em perfis oficiais do governo federal nas redes sociais assim como de informações contra o isolamento social que não estejam "estritamente embasadas em evidências científicas".
Solicitou ainda que o governo publique uma errata em suas redes sociais, afirmando que as informações veiculadas na campanha publicitária não têm embasamento científico. Também quer que redes sociais como Facebook, Instagram, Twitter, Youtube e WhatsApp suspendam o tráfego para postagens estimuladas pela publicidade do governo e adotem estratégias para evitar novas publicações nessa linha.
Nesses dois casos, porém, o Ministério Público preferiu deixar a avaliação a cargo da 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, para onde a ação foi distribuída originalmente.
Fonte: Uol
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