A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, voltou a pedir nesta sexta-feira (3) a suspensão do inquérito aberto para apurar ofensas e ameaças a ministros do Supremo Tribunal Federal.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge — Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Dodge se manifestou na ação apresentada pela Rede Sustentabilidade, que pede para suspender a apuração. Ela já havia requerido o arquivamento do caso, mas o pedido foi rejeitado pelo relator, ministro Alexandre de Moraes.
"A investigação por ministro do STF previamente escolhido, de fatos genéricos, de modo sigiloso, sem a participação do Ministério Público, é prática compatível com o sistema inquisitorial, mas não com o sistema acusatório", afirmou a procuradora.
Segundo a Rede, o inquérito aberto "de ofício", sem participação do Ministério Público, pelo presidente do STF, Dias Toffoli, viola princípios da Constituição. Outro ponto questionado é a escolha de Moraes como relator por designação e não por sorteio, como ocorre normalmente.
A Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) apresentada pela Rede, de 23 páginas, afirma que, por estar em sigilo, o inquérito pode ser direcionado, inclusive "contra jornalistas, parlamentares, membros do governo, membros do Judiciário, Ministério Público, detentores de foro especial, além da cidadania em geral".
No pedido, o partido comparou a investigação ao Ato Institucional 5 ou AI-5, editado durante o regime militar, que deu plenos poderes ao presidente Artur da Costa e Silva. Entre outras medidas, o ato permitiu o fechamento do Congresso, a intervenção do governo federal nos estados, institucionalizou a censura prévia e suspendeu o habeas corpus em casos de crimes políticos.
O relator da ação da Rede, ministro Luiz Edson Fachin, havia pedido manifestação da Procuradoria Geral da República no fim de março, mas somente agora Dodge se manifestou.
Segundo a PGR, o inquérito não trata de fato específico, representando uma situação de insegurança social, pois “acaba conferindo ao STF o poder de investigar toda e qualquer pessoa”.
Ela critica ainda o fato de que isso “será avaliado pelos próprios ministros, vítimas dos supostos ilícitos”.
“Tal circunstância coloca, de certo modo, um número indeterminado de pessoas na condição de permanente alvo potencial da aludida investigação. A situação de insegurança social que daí decorre é patente", afirmou Raquel Dodge.
Aberto em março por decisão de Dias Toffoli, o inquérito foi alvo de críticas inclusive dentro do próprio STF por ter sido aberto sem participação do Ministério Público. O STF, porém, afirma que o regimento interno, que tem força de lei, permite a apuração dentro do tribunal.
Para Dodge, o caso em questão não envolve crimes cometidos no tribunal. "A portaria que o instaurou [...] não traz qualquer elemento que permita concluir que tais fatos se deram nas dependências físicas do tribunal.
Raquel Dodge considera que o inquérito também fere a imparcialidade da justiça, por ser comandado por um juiz.
Segundo ela, a lei exige que “magistrados se mantenham distantes da fase pré-processual de colheita de provas, como forma de garantir a sua imparcialidade e neutralidade, estas também garantias individuais constitucionalmente asseguradas".
Medidas de busca e censura
Raquel Dodge diz ainda que medidas autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes, de busca e apreensão, foram determinadas sem a participação do Ministério Público. “Isso significa que o próprio ministro relator avaliou a pertinência dessas medidas para investigação”, criticou.
“Esse mesmo ministro julgará o resultado da investigação. Aqui, um agravante: além de investigador e julgador, o ministro relator do Inquérito 4781 é vítima dos fatos investigados”, diz Dodge. “Não há como imaginar situação mais comprometedora da imparcialidade e neutralidade dos julgadores – princípios constitucionais que inspiram o sistema acusatório”, completou a PGR.
Arquivamento
Dodge defende ainda que, ao não arquivar o inquérito, como requereu a PGR, Moraes tornou a produção de provas sem utilidade, porque o caso está arquivado.
“Na prática permite que uma investigação flua sem observância dos critérios constitucionais e legais e sem utilidade, pois a PGR já promoveu seu arquivamento por vícios constitucionais”, afirmou.
“Trata-se de ofensas ‘chapadas’, detectáveis de plano e insanáveis, representando vícios originários”, disse Dodge.
Liberdade de expressão
Sobre buscas e bloqueios relacionados a quem fez postagens críticas ao Supremo, Dodge afirmou que "o conteúdo crítico está autorizado pela liberdade de expressão".
"As medidas cautelares foram destinadas a pessoas que fizeram postagens grosseiras e depreciativas. Em que pese não haver dúvida de que ministros do STF merecem o mais elevado respeito, o conteúdo crítico das mensagens está autorizado pela liberdade de expressão garantida a todos pela Constituição”, afirmou Dodge.
Segundo a procuradora-geral, este princípio “autoriza que mesmo as mais altas autoridades públicas do país possam sofrer críticas da população pelos seus atos, ainda que se trate de críticas injustas e ácidas e, por isso, incômodas”.
“Na verdade, justamente por serem autoridades públicas, elas estão sob permanente escrutínio popular, no ambiente republicano, uma das vigas que sustentam o Estado brasileiro”, concluiu.
Para Dodge, a retirada ao conteúdo do site "Antagonista" e do site da revista "Crusoé" representa "típica situação de censura prévia, não autorizada pela Constituição e pelo regime democrático em que ela se funda".
Fonte: G1
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