A perspectiva de uma terceira denúncia criminal, derivada da Operação Skala, deflagrada ontem pela Polícia Federal (PF), põe em xeque a candidatura à reeleição do presidente Michel Temer.
Na investigação, relativa ao decreto baixado no ano passado por Temer determinando regras para renovar a concessão de portos, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a prisão temporária de 13 suspeitos.
Pelo menos quatro deles são ligados a Temer: seu amigo José Yunes, o ex-ministro Wagner Rossi, o ex-presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo, Milton Hortolan, e o coronel João Baptista Lima, que evitava prestar depoimento havia nove meses.
Em seu despacho, Barroso descreve “um esquema contínuo de concessão de benefícios públicos em troca de recursos privados, para fins pessoais e eleitorais, que persistiria por mais de vinte anos no setor de portos, vindo até os dias de hoje”.
Ele relembra que as suspeitas remontam a outro inquérito, de mais de 15 anos, arquivado pelo ministro Marco Aurélio em 2011. O novo inquérito conduzido por Barroso investiga se a ampliação do prazo de concessão dos portos de 25 para 35 anos, com extensão por mais 35, determinada em maio do ano passado por Temer, se deu em troca de propinas e doações eleitorais.
Os principais beneficados pela medida foram a empresa Rodrimar e o Grupo Libra, maiores concessionários de portos no Brasil. A nova suspeita veio à tona em gravações derivadas da delação da JBS, em que o ex-deputado Rodrigo Loures defende a mudança no decreto para ampliar as concessões e até discute o assunto com Temer.
Em troca, a Rodrimar é suspeita de ter pagado propina a Temer por meio da empresa Argeplan, do coronel Lima, ligado a Temer desde os anos 1980, quando o hoje presidente era secretário da Segurança Pública de São Paulo. Num episódio independente, o delator Florisvaldo Oliveira, da JBS, já descreveu como entregou R$ 1 milhão em dinheiro vivo na sede da Argeplan, no bairro da Vila Madalena, em São Paulo.
Segundo as novas investigações da PF, a Argeplan cuidou de uma reforma na casa da filha de Temer. A empresa também manteve contrato com a construção de Angra 3, investigada pela Operação Lava Jato no Rio de Janeiro. De acordo com o delator Ricardo Saud, também da JBS, ela servia de fachada para o pagamento de propinas a Temer.
Outro foco das investigações, o Grupo Libra, foi beneficiado no início de 2016 por uma manobra do deputado Eduardo Cunha, na ocasião do mesmo grupo político de Temer. O Libra controla há mais de 20 anos uma área nobre no porto de Santos. Mas uma Medida Provisória de 2015 impediria a renovação da concessão.
Na formulação original, ela não permitia que empresas endividadas continuassem a prestar o serviço. O Libra devia quase R$ 1 bilhão na praça. Uma emenda de Cunha em janeiro de 2016 abriu, contudo, uma brecha para renovar a concessão. De acordo com o delator Lúcio Funaro, a emenda foi um pagamento pelas doações eleitorais do Libra à campanha de Temer em 2014. Funaro apontou ainda Yunes como operador financeiro de Temer
As investigações da PF são corroboradas por um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgado no início da semana pela GloboNews. No relatório, assinado pelo ministro Bruno Dantas, os técnicos apontam no decreto dos portos “forte indício de infração aos princípios da isonomia, da vinculação ao instrumento convocatório e da seleção da proposta mais vantajosa”. Afirmam ainda que ele “contempla disposições normativas com fortes indícios de ilegalidade”.
Todos os novos fatos expostos pela PF são negados pelos envolvidos. Temer já foi inquerido por escrito e seus sigilos fiscal e financeiro foram quebrados por Barroso. Se o inquérito resultar em denúncia contra ele, ela terá novamente de passar por votação pela Câmara dos Deputados antes de ser aceita pelo STF.
Seria a terceira denúncia contra Temer em cerca de um ano. As outras duas, apresentadas pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot, foram postas em suspenso até Temer deixar a Presidência. Desta vez, a responsável seria a procuradora-geral Raquel Dodge. Indicada pelo próprio Temer ao cargo no ano passado, será impossível acusá-la de motivações políticas, como o governo fez com Janot.
Mesmo que o inquérito não resulte em nada ou que a a Câmara decida engavetar mais uma denúncia, todas as novas informações circularão na campanha eleitoral. Não há como tal situação favorecer a candidatura a reeleição do presidente mais impopular da história recente.
O plano alternativo do MDB é lançar, em vez de Temer, o ministro Henrique Meirelles à Presidência. Temer poderia sair de vice, ficar com algum ministério ou cargo que lhe garanta a proteção do foro privilegiado no STF e mantenha na gaveta as duas denúncias que lá estão – talvez a nova também. Se bem que, como demonstra a ação deflagrada ontem por Barroso, seu foro no STF pode não ser tão privilegiado quanto parece.
Fonte: Blog do Helio Gurovitz
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