O diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, afirmou nesta sexta-feira (9), em entrevista à agência Reuters, que a tendência é que a corporação recomende o arquivamento da investigação contra o presidente Michel Temer no chamado inquérito dos portos.
Segundo o chefe da PF, até o momento, as investigações não comprovaram que houve pagamento de propina por parte de representantes da empresa Rodrimar, que opera áreas do porto de Santos (SP), para a edição do decreto que prorrogava contratos de concessão e arrendamento portuários, assinado por Temer em maio do ano passado.
(A TV Globo confirmou o teor das informações apuradas pela agência Reuters. A investigação da Polícia Federal é uma etapa do processo, não a definitiva. As investigações da PF serão enviadas ao Supremo Tribunal Federal e remetidas à Procuradoria Geral da República.)
Essa é a única apuração formal contra o presidente ainda em curso perante o Supremo Tribunal Federal (STF), requerida ainda pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Segovia disse à Reuters nesta sexta-feira que, nas apurações feitas, não há quaisquer indícios de que o decreto editado pelo presidente beneficiou a Rodrimar. Ele destacou que a empresa não era atingida pelo decreto, que mudou regras de concessão posteriores a 1993, o que não seria o caso dela.
"O que a gente vê é que o próprio decreto em tese não ajudou a empresa. Em tese se houve corrupção ou ato de corrupção não se tem notícia do benefício. O benefício não existiu. Não se fala e não se tem notícia ainda de dinheiro de corrupção, qual foi a ordem monetária, se é que houve, até agora não apareceu absolutamente nada que desse base de ter uma corrupção", disse Segovia.
O diretor-geral da PF também afirmou que a "principal prova obtida no inquérito", a interceptação de uma conversa entre o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, ex-assessor especial de Temer, e o subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha, não mostra concordância de Temer com o suposto benefício.
Segundo ele, o próprio Gustavo Rocha fala no diálogo que não há como fazer ou mudar a questão do decreto e que o próprio presidente não aceitou a mudança que poderia beneficiar a empresa.
"Então, assim, os indícios são muito frágeis, na realidade, de que haja ou que houve algum tipo de influência realmente, porque em tese o decreto não foi feito para beneficiar aquela empresa", disse Segovia.
A suspeita era que o presidente teria recebido propina, por intermédio de Rocha Loures, para favorecer a Rodrimar. Tanto o ex-assessor especial quanto Temer já prestaram depoimento no inquérito e negaram irregularidades. O presidente se manifestou por escrito.
Rocha Loures chegou a ser preso depois que foi filmado pela PF saindo de um restaurante com uma mala de dinheiro pago por um executivo da processadora de carnes JBS no âmbito de uma outra investigação. Foi posteriormente solto e agora é monitorado com uso de tornozeleira eletrônica. Ele é réu acusado de corrupção no caso envolvendo a mala de dinheiro.
Para Segovia, que assumiu o posto em novembro do ano passado, durante o governo Temer, a empresa não se beneficiou diretamente porque o decreto não atingiu o contrato da Rodrimar, ou seja, o "objeto em tese da corrupção não foi atingido". "Então ficou muito difícil de ter uma linha de investigação numa corrupção que em tese não ocorreu", reforçou.
O chefe da PF afirmou que outros depoimentos colhidos na instrução do inquérito também não conseguiram comprovar o cometimento de crime pelos investigados.
"No final a gente pode até concluir que não houve crime. Porque ali, em tese, o que a gente tem visto, nos depoimentos as pessoas têm reiteradamente confirmado que não houve nenhum tipo de corrupção, não há indícios de realmente de qualquer tipo de recurso ou dinheiro envolvidos. Há muitas conversas e poucas afirmações que levem realmente a que haja um crime", disse.
Segundo ele, ainda há algumas diligências a serem feitas, mas ele avalia que em no máximo três meses a apuração será concluída.
O diretor-geral disse que, durante a instrução do inquérito, também foram requisitadas informações de outra investigação arquivada contra o presidente sobre suposto crime cometido por Temer em um suposto esquema de cobrança de propina de empresas detentoras de contratos no porto de Santos, em São Paulo. A intenção seria saber se haveria ligação da apuração antiga com a atual, uma vez que Temer era líder da bancada do MDB e poderia ter atuado na indicação de uma das pessoas envolvidas em delitos.
Segovia, entretanto, disse que o envolvimento de Temer se deu a partir de uma citação em uma audiência de uma pensão alimentícia da esposa de um ex-diretor da Cia Docas, e isso "caiu por terra" duas vezes, arquivada pelo Supremo, destacando ainda que a indicação da pessoa teria sido feita por "várias lideranças políticas", não apenas por Temer.
"Então o inquérito (arquivado) na verdade não se demonstra aproveitável para qualquer tipo de questionamento. Até porque o que está sendo apurado e que o Supremo está investigando e tem autorização é justamente a questão da corrupção na construção desse decreto", argumentou.
Em respostas a perguntas formuladas pela PF no inquérito, Temer disse em janeiro que "depositava confiança" em Rocha Loures quando ele exercia o cargo de assessor especial da Presidência, mas destacou que nunca pediu-lhe para receber recursos ilícitos em seu nome.
Afirmou ainda que a Rodrimar não foi beneficiada com a edição dos decretos e que o assunto foi tratado no âmbito de uma comissão do Ministério dos Transportes.
O diretor-geral da PF, Fernando Segovia, e o presidente Michel Temer durante evento em novembro de 2017 (Foto: Marcos Corrêa/PR)
'Muito aberto'
Segovia criticou a forma de investigação instaurada por Janot contra Temer. Formalmente, a apuração é por corrupção passiva e tráfico de influência. O diretor-geral afirma que o ex-chefe do Ministério Público Federal "deixou o troço muito aberto porque tem um espectro muito maior para ver se pega alguma coisa".
"É para ver se cata alguma coisa, corrupção, tráfico de influência... vai que cai em alguma coisa?", questionou. "Aí você enquadra depois", completou.
Questionado se o inquérito está próximo de ser concluído, o chefe da PF afirmou que o delegado responsável pelo caso, Cleyber Malta Lopes, está voltando de um curso no exterior e devem conversar.
"Mas eu acredito que não dure muito mais tempo, não tem muitas diligências mais a serem feitas. Acredito que em um curto espaço de tempo deve ter a conclusão dessas investigações", disse.
Para o chefe da PF, há a necessidade de tirar o caso a limpo, por isso é preciso se aprofundar na investigação, buscar provas em todos os lugares porque "quando a gente concluir a investigação e não houver realmente o fato a gente possa afirmar, 'olha não houve crime, não houve o fato'".
Perguntado se a apuração exaustiva tem por objetivo evitar questionamentos da imprensa, ele concordou. "Estamos fazendo nosso trabalho, que é a investigação criminal. Então tudo que for indício que possa reportar uma possibilidade que ache uma prova que sustente esse tipo de acusação a gente vai ter que checar. É muito mais uma checagem de tudo que a gente tem para que no final não dê um veredicto ‘olha checamos tudo e não tem nada’. 'Ah, mas vocês checaram tudo mesmo?'. Sim, foi tudo verificado", concluiu.
Caberá à atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge, decidir se eventualmente aceita a recomendação da PF e, se não houver alguma reviravolta, pedir ao Supremo o arquivamento da apuração, requerer novas diligências ou ainda, apesar da instrução feita pela PF, oferecer denúncia contra o presidente.
Raquel Dodge -que é a responsável por conduzir as apurações contra autoridades com foro privilegiado no STF- não é obrigada a seguir a sugestão feita pela PF.
Fonte: G1
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