A nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para os ensinos infantil e fundamental foi aprovada nesta sexta-feira (15) em votação no Conselho Nacional de Educação (CNE). Foram 20 votos a favor e três votos contrários, de acordo com Eduardo Deschamps, presidente do CNE.
A BNCC dá diretrizes para orientar a elaboração dos currículos das redes municipais, estaduais e federal de ensino, tanto nas escolas públicas quanto particulares. O novo documento não trata do ensino médio. A base curricular para o ensino médio ainda será avaliada posteriormente pelo CNE.
Destaques e próximos passos
Ensino religioso ganha diretrizes sobre o que deve ser ensinado do 1º ao 9º ano
Alfabetização deve ser concluída até o segundo ano
Orientações sobre identidade de gênero devem ser discutidas por comissão do CNE
Redes municipais, estadual e federal precisam reelaborar seus currículos segundo a BNCC
Material didático terá que ser produzido segundo as novas diretrizes
Implementação deve estar completar até início do ano letivo de 2020
Redes devem preparar currículos
Durante a reunião, o conselheiro Cesar Callegari, presidente da comissão da BNCC, lembrou que a base "é um conjunto de referenciais inédito na história do país" e que agora redes e escolas precisam preparar os detalhes de como serão seus currículos.
"Base não é currículo, é um conjunto de referenciais sobre as quais o processo crítico e criativo das escolas vai elaborar seu processo curricular", afirmou
"A Base não é um currículo mínimo. (...) A função da escola e da rede não é copiar e colar a Base", complementou o conselheiro Chico Soares, lembrando que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) continua em vigor e determina que é responsabilidade das escolas elaborarem seus currículos.
O texto aprovado no CNE será agora homologado pelo ministro da Educação, Mendonça Filho. De acordo com o Ministério da Educação (MEC), "todas as escolas e redes de ensino deverão adaptar e rever os seus currículos em 2018 para iniciar a implementação da base em 2019 e até 2020".
Processo de votação
Prevista pelo Plano Nacional de Educação (PNE) para estar pronta em meados de 2016, a Base sofreu atrasos. Em abril, o Ministério da Educação (MEC) entregou ao CNE a 3ª versão do texto. Em seguida, de julho a setembro, foram feitas audiências públicas para que a população e profissionais pudessem opinar e sugerir mudanças no documento. Em novembro, o CNE debateu as propostas com o MEC.
A discussão do texto final da BNCC começou sob críticas de entidades e protestos de professores no dia 7 de dezembro. Três conselheiras apontaram que não houve transparência no debate, e que o MEC não divulgou amplamente o documento final. Por isso, elas pediram vista para discutir o texto.
Entretanto, como o CNE tinha maioria já favorável ao texto e tinha interesse em fechar o processo ainda em dezembro, foi aprovado o regime de urgência e concedido o prazo de uma semana para elaboração do parecer a partir do pedido de vista.
Nesta sexta, as conselheiras Aurina de Oliveira Santana, Malvina Tania Tuttman e Márcia Ângela da Silva Aguiar deram parecer contra o que chamaram de "aprovação intempestiva" da Base Nacional Comum Curricular. Entretanto, o parecer original dos relatores obteve maioria no Conselho Nacional.
Em seu parecer, as conselheiras apontaram que o processo foi "verticalizado", sob influência do Ministério da Educação (MEC), e afirmam que há documentos incompletos dentro da Base e dizem não concordar com a separação do ensino médio.
Callegari dissse que o pedido de vista das conselheiras permitiu uma série de ajustes no texto, que chegou à votação do CNE com "muitos fios soltos e questões a serem resolvidas". Agora, segundo ele, o conselho precisa se debruçar sobre temas que garantam a implementação das novas diretrizes. Ele citou o financiamento por meio do Custo Aluno-Qualidade inicial (CAQi) e a valorização dos professores.
Destaques da Base Curricular
O documento gerou discussão e gerou protestos principalmente quanto ao ensino religioso e aos debates sobre gênero:
Ensino religioso
Segundo o artigo 23 da resolução, o ensino religioso dependerá de uma comissão específica que decidirá se ele deve entrar como área de conhecimento (com o mesmo status, por exemplo, de linguagens ou matemática) ou como componente curricular dentro da área de humanas.
Com a aprovação, os objetivos do ensino religioso serão os seguintes:
Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes tradições/movimentos religiosos e filosofias de vida, a partir de pressupostos científicos, filosóficos, estéticos e éticos.
Compreender, valorizar e respeitar as manifestações religiosas e filosofias de vida, suas experiências e saberes, em diferentes tempos, espaços e territórios.
Reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da natureza, enquanto expressão de valor da vida.
Conviver com a diversidade de identidades, crenças, pensamentos, convicções, modos de ser e viver.
Analisar as relações entre as tradições religiosas e os campos da cultura, da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia e do meio ambiente.
Debater, problematizar e posicionar-se frente aos discursos e práticas de intolerância, discriminação e violência de cunho religioso, de modo a assegurar os direitos humanos no constante exercício da cidadania e da cultura de paz.
Identidade de gênero
De acordo com o documento, o CNE emitirá orientações específicas sobre orientação sexual e identidade de gênero. Não foram fornecidos mais detalhes sobre esse processo.
O MEC não divulgou a versão final do texto, mas a pasta já tinha tirado o termo "orientação sexual" da terceira versão da BNCC apresentada em abril deste ano.
Alfabetização
Outra alteração ao sistema vigente é relativa à alfabetização: ela deve ser garantida no primeiro e no segundo ano do ensino fundamental. Até então, as escolas tinham até o terceiro ano para isso, quando as crianças têm 8 anos de idade. A decisão de antecipar a alfabetização foi criticada por especialistas.
O conselheiro e relator Chico Soares defendeu que a alfabetização é um dos destaques da Base por deixar claro qual o direito do aluno. "Há uma definição do que é estar alfabetizado", disse, lembrando que o texto define que a BNCC define que estará alfabtizada a criança que conseguir "ler e produzir textos adequados ao seu momento".
Competências gerais da Base
A seguir, veja as competências gerais previstas da Base:
Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.
Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das iferentes áreas.
Desenvolver o senso estético para reconhecer, valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também para participar de práticas diversificadas da produção artístico cultural.
Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.
Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.
Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.
Conhecer se, apreciar se e cuidar de sua saúde física e emocional, compreendendo se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas.
Exercer a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza.
Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões, com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.
Fonte: G1