O Tribunal de Contas do Rio Grande do Norte condenou nesta quarta-feira (18) dois desembargadores e outras oito pessoas, além da empresa Glex Empreendimentos e Serviços Exclusivos Ltda, pelo esquema de desvio de dinheiro do setor de precatórios do Tribunal de Justiça. As partes foram condenadas a devolver, cada uma, o valor desviado. A Corte decidiu ainda que todos devem pagar multa, que foi calculada com base nesse montante.
Entre os condenados estão os desembargadores aposentados Rafael Godeiro e Osvaldo Cruz, e a ex-chefe do setor de precatórios Carla Ubarana, além do marido dela, George Leal.
O processo que tramita no Tribunal de Contas do Estado se refere às questões administrativas relacionadas a atuação dos envolvidos nos cargos públicos, diferentemente do que corre no Tribunal de Justiça, que avalia implicações judiciais aos envolvidos.
O julgamento do mérito do processo teve início em 31 de janeiro deste ano, com a leitura do voto do relator. Na ocasião, o conselheiro do TCE, Carlos Thompson, pediu vistas após o posicionamento de Paulo Roberto, que isentou de culpa os dois desembargadores. O julgamento foi retomado nesta quarta (18), em sessão extraordinária.
Em seu posicionamento, o relator Paulo Roberto considerou culpados pelos desvios de precatórios do TJRN a então chefe do setor, Carla Ubarana, e o marido dela, George Leal. Para os dois, o relator determina a devolução do valor de R$ 14.195.702,82, referente ao que foi desviado, segundo apontou a auditoria do Tribunal de Contas. Além disso, ele aplicou multa de 10% desse valor a cada um deles, e à empresa Glex, pertencente a George Leal. Segundo o voto, ele e Carla Ubarana devem ficar oito anos sem poder exercer cargos públicos.
As demais partes apontadas como participantes do esquema foram isentadas de culpa pelo relator, incluindo os desembargadores Osvaldo Soares da Cruz e Rafael Godeiro Sobrinho.
A posição apresentada na sessão extraordinária por Carlos Thompson divergiu do relator. Além de apontar dez pessoas e a empresa de George Leal como culpadas, o conselheiro aplicou multa a todos, bem como determinou a devolução do dinheiro. Ao final da exposição das teses, a Corte de Contas decidiu, por 6 a 2, pelo voto de Carlos Thompson.
Carlos Thompson, conselheiro do Tribunal de Contas do RN (Foto: Jorge Filho/TCE)
Resultado
Com o resultado, ficou definido pelo TCE que cada uma das partes deve devolver o dinheiro desviado e pagar uma multa sobre esse valor. O montante é determinado para cada um dos envolvidos corresponde ao que teria sido gerido por eles no esquema.
O desembargador Rafael Godeiro deve devolver ao erário R$ 5.458.826,16, além de pagar uma multa de 12% dessa quantia, o que corresponde a R$ 655.059,14. Já Osvaldo Cruz precisa devolver R$ 3.063.430,47 e pagar multa de 10% do valor, R$ 306.343,05.
Carla Ubarana e George Leal foram igualmente condenados à devolução de R$ 14.195.702,82 aos cofres públicos. Com relação à multa, a ela foi aplicada em 10% do valor total, e a ele, 8%. R$ 1.419.570,28 e R$ 1.135.656,23, respectivamente
Os desembargadores foram estão proibidos ainda de ocupar cargos públicos por seis anos. Carla e George também estão proibidos de exercer funções públicas, estes por oito anos.
O Caso
A ex-chefe da Divisão de Precatórios do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte Carla de Paiva Ubarana Araújo Leal e o marido dela, George Leal, foram presos inicialmente em fevereiro de 2012. Em 2013, os dois foram condenados por fraudes na divisão de Precatórios do TJRN. Segundo a denúncia do Ministério Público, Carla encabeçava um esquema que desviou R$ 14.195.702,82 do TJ. Os mandados de prisão foram expedidos pelo juiz da 7ª vara Criminal de Natal, José Armando Ponte Dias Junior.
Condenação
Carla Ubarana foi condenada inicialmente a 10 anos, 4 meses e 13 dias, mais 386 dias-multa em regime fechado. George Leal pegou pena de 6 anos, 4 meses e 20 dias, mais 222 dias-multa em regime semiaberto. Os dois foram condenados por peculato.
José Armando Ponte, ainda na sentença, mandou que todos os bens apreendidos em nome de Carla e George fossem leiloados e que o dinheiro arrecado nesses leilões fosse depositado em conta a ser definida pelo Tribunal de Justiça. Essa mesma conta deve receber o dinheiro em espécie - moeda nacional e estrangeira - apreendido com o casal.
Na sentença, o juiz José Armando Ponte diz que "era Carla Ubarana, com sua inteligência aguçada, quem comandava, com maestria, rigidez e desenvoltura, as ações praticadas por George Leal e pelos 'laranjas'". Sobre o marido de Carla, o magistrado diz: "George Leal mostra-se orgulhoso das condutas criminosas que praticou, as quais detalha com especial soberba, especialmente quando detalha, em minúcias e pormenores, o passo a passo da construção e reforma da sua casa praiana em Baía Formosa, enfatizando a qualidade do material utilizado e o bom gosto arquitetônico".
Os demais réus foram absolvidos, com exceção dos desembargadores Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro. O processo que trata sobre a atuação dos dois no esquema está parado desde novembro do ano passado na 8ª vara criminal.
Operação Judas
Carla Ubarana não havia prestado concurso para entrar no Tribunal de Justiça. Ela foi incorporada ao quadro de servidores efetivos ainda na década de 80, antes da normatização da Constituição Federal, que obriga a realização de concurso público para admissão de servidores municipais, estaduais e federais. Ao longo de mais de uma década, Ubarana ocupou diferentes posições no Tribunal e foi demitida enquanto ocupava o cargo de técnico judiciário de 3º entrância da Comarca de Natal. O salário da ex-servidora girava em torno de R$ 9 mil.
A demissão de Carla Ubarana ocorreu dias após a própria presidenta do TJ à época, Judite Nunes, determinar a retomada do pagamento do salário da ex-servidora, suspenso desde junho. A ex-servidora e seu marido, o empresário George Leal, foram presos em janeiro de 2012 em Recife.
O esquema de corrupção foi investigado pelo Ministério Público Estadual e desencadeou a Operação Judas. Após acordo de delação premiada, Carla e George assumiram a autoria dos crimes e citaram que tudo ocorria sob a anuência dos ex-presidentes do TJRN, os desembargadores Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro. Ambos foram afastados da Corte potiguar pelo Conselho Nacional de Justiça e foram condenados à perda do cargo.
Fonte: G1
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