Com dificuldades para conseguir toda assistência necessária na rede pública desde que descobriu um câncer na mama esquerda, uma mulher de 49 anos passou a vender garrafas de água em um semáforo na área central de Brasília para custear exames. Maria Montalvão percorre diariamente 43,5 quilômetros entre Planaltina, onde mora, e a Rodoviária do Plano Piloto. Cada unidade é vendida a R$ 2 e, junto, leva parte da história da mulher.
“O médico proibiu de eu estar aqui trabalhando. Não posso pegar sol, não posso pegar peso, não posso ficar de pé muito tempo, só que eu preciso. Tenho uma filha de 9 anos, de quem sou mãe e pai, porque sou viúva”, afirma.
Maria chegou a fazer oito sessões de quimioterapia no Hospital de Base e ouviu da médica que vai precisar extrair toda a mama. O tratamento acabou há dois meses e, desde então, ela aguarda vaga para cirurgia. Por duas vezes ela foi para a sala de operação, mas o procedimento foi cancelado por falta de anestesista.
À TV Globo, a Secretaria de Saúde disse que a intervenção deve ocorrer no dia 28. A pasta também declarou ter um déficit de cem anestesistas – atualmente há 300. Maria afirmou que não foi comunicada a respeito da nova data da cirurgia.
Enquanto a extração do câncer é protelada, a viúva precisa manter os exames atualizados. Por dia, ela vende 24 garrafinhas de água. Eventualmente, também leva refrigerantes e salgados para agradar os “clientes”. Maria fica no local entre 9h40 e 17h30.
“Não consegui nenhum exame pela rede pública. Um me ajuda daqui, outro me ajuda de acolá. Exames vencem, quando vou arrumar dinheiro para pagar outro? E a doença não espera também.”
Produtos vendidos por Maria Montalvão em semáforo de Brasília para custear exames de câncer (Foto: TV Globo/Reprodução)
“Os exames que eu fiz foram todos particulares, vendendo água, sofrendo. Um aqui que me ajuda, um dá R$ 5, o outro me dá R$ 10. Esse pessoal aqui me ajuda porque tá vendo o sacrifício que eu estou aqui vendendo água todo dia”, completou.
Membro da Sociedade Brasileira de Oncologia, o médico Eduardo Vissotto disse que Maria de fato tem razão de se preocupar. As chances de cura para câncer de mama caem quando a operação não é feita no estágio inicial – nessa fase, o índice é de 90%.
“Se atrasar a abordagem cirúrgica, esse paciente pode estar perdendo a chance de cura e o tumor pode voltar a crescer”, afirmou. “O cirurgião consegue, além de retirar o tumor da mama, retirar os gânglios que possam estar acometidos pela doença e impedir que essa doença se dissemine para outros órgãos a partir da corrente sanguínea, que é o que mais nos preocupa.”
Maria Montalvão com garrafa de água; ela vende produto para custear exames de câncer no DF (Foto: TV Globo/Reprodução)
Maria diz esperar que a cirurgia ocorra em breve. “Teve dia de minha filha me pedir um pão e eu não ter para dar, enquanto fazia quimioterapia. Tem dias em que eu fico meio chateada, meio sensível. O que mais me dá força é minha garra, minha vontade de viver, de estudar, de ver minha filha formar.”
Rede pública
A Secretaria de Saúde informou em nota que “não tem medido esforços” para aumentar o quadro de anestesistas da rede. “No entanto, mesmo com todas as convocações feitas recentemente, a SES/DF não tem conseguido preencher todas as vagas, pois muitos convocados não chegam a se apresentar para o cargo. Com isso, são priorizadas as cirurgias de emergência. Os procedimentos eletivos são realizados à medida que surgem vagas nos centros cirúrgicos.”
Fachada do Hospital de Base de Brasília (Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília)
De acordo com a pasta, atualmente há 700 pessoas na fila para a primeira consulta em oncologia. A secretaria disse que, havendo definição do tratamento por quimioterapia, o paciente inicia o tratamento imediatamente. A fila para radioterapia, afirma, é de 650 pessoas. A da mamografia, declara, está zerada.
Fonte: G1
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