Responsável pelas duas campanhas eleitorais de Dilma Rousseff, o marqueteiro João Santana contou à Procuradoria Geral da República (PGR) que a ex-presidente Dilma Rousseff recomendou, no fim de 2014, que ele e a esposa dele permanecessem "o tempo que pudessem, por cautela, fora do país" por causa da Operação Lava Jato.
O publicitário e a mulher dele, Mônica Moura, fecharam um acordo de delação premiada com a PGR para reduzir a pena de prisão. A colaboração foi homolagada pelo ministro Edson Fachin, relator dos processos da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), em 4 de abril.
Nesta quinta (11), Fachin derrubou o sigilo das delações premiadas do casal de marqueteiros. O relator da Lava Jato também retirou o sigilo da delação de André Luis Reis Santana, funcionário da empresa comandada pela dupla de publicitários.
Em nota, a assessoria de Dilma afirmou, entre outras coisas, que a ex-presidente reitera que João Santana e Mônica Moura "prestaram falso testemunho e faltaram com a verdade em seus depoimentos, provavelmente, pressionados pelas ameaças dos investigadores"
Em um dos anexos apresentados por João Santana ao Ministério Público com informações que ele poderia revelar na delação premiada, ele descreve uma conversa que teve com Dilma, em um almoço privado no Palácio da Alvorada, entre outubro e novembro de 2014. Na ocasião, a petista já havia sido reeleita.
De acordo com o publicitário, na conversa particular, a então presidente comentou sobre "rumores do medo" que o empresário Marcelo Odebrecht tinha da Operação Lava Jato.
João Santana disse aos procuradores da República que Dilma relatou que o dono da empreiteira estaria vazando informações a interlocutores dela sobre pagamentos que havia feito para bancar despesas da campanha à reeleição, "como forma de enviar um recado" para a então presidente.
Em meio à conversa, disse o publicitário, a petista teria questionado se os pagamentos da Obebrecht tinham sido "feitos de forma segura". Ele afirmou à PGR que assegurou à ex-presidente que "sim", mas não deixou claro se Dilma tinha conhecimento da origem ilícita do dinheiro.
Neste momento, ressaltou Santana, ela recomendou que o marqueteiro e a mulher dele "permanecessem, por cautela, fora do país" e que, "qualquer novidade", ela "avisaria". À epoca, os dois publicitários estavam atuando em campanhas eleitorais de outros países latino-americanos.
'Chamado urgente'
Em outro trecho do anexo entregue à PGR, João Santana contou detalhes sobre uma conversa que teria ocorrido no fim de novembro de 2014 – pouco tempo depois do almoço no Alvorada – entre Dilma e Mônica Moura. Em sua pré-acordo de delação premiada, a mulher do marqueteiro também dá detalhes sobre esse episódio.
Segundo eles, Mônica recebeu um "chamado urgente" para se encontrar com a então presidente da República, em Brasília. Na ocasião, relataram os delatores, eles estavam de férias em Nova York.
Na oportunidade, a presidente DILMA ROUSSEF reforçou a sugestão de que JOÃO SANTANA e MONICA MOURA permanecessem fora do país e se comprometeu a mandar qualquer alerta por uma conta de e-mail criada com MONICA MOURA exclusivamente para este fim
Diante da convocação, a marqueteira fez um voo bate-volta dos Estados Unidos ao Brasil para se reunir com a petista na residência oficial da Presidência.
Santana disse ao Ministério Público que, nesta reunião, Dilma "reforçou a sugestão" para o casal de marqueteiros permanecer "fora do país". Ele acrescentou ainda que a ex-presidente teria prometido mandar "qualquer alerta" por uma conta de e-mail fictícia criada por Mônica Moura para que ela e Dilma trocassem informações sobre o avanço da Lava Jato.
E-mail fictício
Em um dos anexos de sua delação premiada, Mônica Moura contou, com detalhes, o suposto encontro com Dilma no Palácio da Alvorada após ter sido chamada às pressas de Nova York.
Segundo a marqueteira, ao ser levada à residência oficial pelo assessor Giles Azevedo, ela conversou com Dilma caminhando pelos jardins do Alvorada.
Na colaboração, Mônica destacou que, sempre que Dilma tinha algum assunto sigiloso para tratar com ela ou com João Santana, optava por fazê-lo em caminhadas pelo jardim, ou pela varanda interna, como forma de preservar o sigilo da conversa.
A publicitária afirmou que, na conversa, a petista estava preocupada que as investigações da Lava Jato chegassem às contas dos dois marqueteiros no exterior, o que colocaria Dilma "em perigo".
Conforme Mônica, a ex-presidente sabia que a Odebrecht tinha feito pagamentos da campanha presidencial do PT por meio de "depósitos de propinas na conta do casal".
"Precisamos manter contato frequente de uma forma segura para que eu lhe avise sobre o andamento da operação. Estou sendo informada de tudo frequentemente pelo José Eduardo Cardoso [então ministro da Justiça]", teria dito Dilma, de acordo com o relato de Mônica Moura.
Elas, então, teriam combinado a criação de uma conta de e-mail fictícia para trocar informações sobre a Lava Jato.
"Mônica Moura, então, criou ali mesmo, no computador da presidente (notebook), na biblioteca do Palácio da Alvorada, um e-mail do Google (Gmail), com nome e dados fictícios, cuja senha era de conhecimento de Mônica Moura, da presidente Dilma Rousseff e de seu assessor Giles Azevedo, que acompanhou essa parte da conversa (criação do e-mail)", diz outro trecho do anexo apresentado pela marqueteira à PGR.
A publicitária destacou ainda que, naquele dia, ela e a então presidente combinaram que, "se houvesse alguma notícia com relação ao avanço da Lava Jato", a petista avisaria por meio da conta de e-mail fake.
De acordo com Mônica, ficou acertado na conversa que sempre que Dilma fosse atualizada pelo ministro da Justiça de assuntos envolvendo o casal de marqueteiros na Lava Jato, o assessor Giles Azevedo enviaria uma mensagem cifrada no celular da publicitária como sinal para ela checar a conta de e-mail falsa.
No entanto, observou a marqueteira, elas acertaram que nenhum e-mail seria enviado pela conta fictícia. Para se comunicar, contou Mônica, elas combinaram de redigir mensagens no rascunho para que as mensagens não circulassem.
"Assim, Mônica Moura entrava no e-mail criado, e conseguia obter as informações que a presidente passava sobre a Operação Lava Jato, bem como perguntar qualquer dado ou informação. Por esse e-mail, Mônica Moura foi sistematicamente informada sobre o andamento da operação", ressaltou a marqueteira em um dos trechos do anexo.
Mandados de prisão
Em 1º de maio de 2015, relatou Mônica, Dilma pediu para ficar a sós com ela durante a gravação de um pronunciamento da ex-presidente no qual também estava presente João Santana.
Conforme a marqueteira, a petista demonstrou na conversa que estava preocupada com os desdobramentos rápidos da Lava Jato. "Ela não tinha controle sobre a operação", enfatizou Mônica Moura.
Neste dia, de acordo com a publicitária, elas criaram, na bibilioteca do Alvorada, uma segunda conta de e-mail para se comunicar sobre os bastidores da operação que investiga o esquema de corrupção que atuava na Petrobras, por sugestão da própria presidente.
Posteriormente, Mônica disse que passou a receber na República Dominicana – onde estava atuando em uma campanha eleitoral – "constantes informações" sobre o andamento da Lava Jato por meio das duas contas de e-mail fake.
"Os textos eram sempre metafóricos, mas seu conteúdo sempre se referia a proximidade da operação quanto a Mônica Moura e João Santana", ressalta a delação da publicitária.
A delatora afirmou aos procuradores da República que, em 16 de fevereiro de 2016, foi avisada, por meio da suposta conta de e-mail criada em conjunto com Dilma, de que já havia mandados de prisão assinados contra ela e o publicitário João Santana.
O casal de publicitários foi preso no dia 23 de fevereiro do ano passado, após se entregarem à Polícia Federal (PF) no momento em que desembarcaram de um voo vindo da República Dominicana.
Eles foram alvos da 23ª fase da Lava Jato – batizada de Acarajé –, mas não foram presos no dia em que foi deflagrada a operação porque estavam fora do país. Os publicitários foram soltos seis meses depois por ordem do juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância.
O magistrado do Paraná condenou o casal, em fevereiro deste ano, a 8 anos e 4 meses de prisão por lavagem de dinheiro.
Leia a íntegra da nota divulgada pela assessoria de Dilma sobre as acusações do casal de marqueteiros:
Dilma: Fim do sigilo chega tarde e prejudicou a defesa no TSE
Sobre os depoimentos sigilosos de João Santana e Monica Moura, liberados na tarde desta quinta-feira, 11 de maio, a Assessoria de Imprensa de Dilma Rousseff destaca:
1. Infelizmente, chega tarde a decisão do relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, ministro Edson Fachin, suspendendo o sigilo dos depoimentos de João Santana e Monica Moura.
2. Há semanas, a defesa da presidenta eleita Dilma Rousseff havia feito tal pedido ao Tribunal Superior Eleitoral, a fim de apresentar suas alegações finais ao relator do caso das contas de campanha, ministro Herman Benjamin.
3. A defesa foi prejudicada pela negativa do relator. Não foi possível cotejar os depoimentos prestados pelo casal à Justiça Eleitoral e na Lava Jato.
4. As contradições e falsos testemunhos foram vislumbrados, apesar disso, pelo que foi divulgado amplamente pela imprensa, na velha estratégia do vazamento seletivo dos depoimentos – uma rotina nos últimos tempos.
5. Agora mesmo, os depoimentos são entregues à imprensa, mas não repassados oficialmente à defesa da presidente eleita.
6. Dilma Rousseff, contudo, reitera o que apontou antes: João Santana e Monica Moura prestaram falso testemunho e faltaram com a verdade em seus depoimentos, provavelmente pressionados pelas ameaças dos investigadores.
7. Apesar de tudo, a presidente eleita acredita na Justiça e sabe que a verdade virá à tona e será restabelecida.
ASSESSORIA DE IMPRENSA
DILMA ROUSSEFF
Fonte: G1
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