A chamada ‘lei da gorjeta’ passa a valer em todo o Brasil neste sábado (13), 60 dias após ter sido sancionada pelo presidente Michel Temer. Ela regulamenta a cobrança e a divisão de gorjetas em restaurantes, hotéis, motéis e “estabelecimentos similares”, segundo o texto da lei. Para o cliente, nada vai mudar, o pagamento continua opcional.
Funcionários de restaurantes de São Paulo ouvidos pelo G1 dividem opiniões. Já para os especialistas, eles afirmam que a lei é positiva porque deixa as regras claras e dá maior segurança jurídica para patrões e empregados.
A principal mudança apontada é sobre a famosa “caixinha”. Hoje, cada estabelecimento faz de um jeito. Em alguns lugares, a gorjeta é paga “por fora”, com o valor integral para os funcionários. Agora, ela terá que constar na folha de pagamento, o que, por um lado, resulta em descontos no valor pago, e, por outro, melhora décimo terceiro, FGTS e aposentadoria.
Em um restaurante da Rua Fidalga, na Vila Madalena, enquanto recolhe os pedidos ou equilibra a bandeja, o veterano garçom Calixto Pinheiro explica porque aprova a mudança. “Acho que é uma boa porque tem chance do pessoal se organizar e planejar mais. Porque todo dinheiro que a gente pega, a gente gasta, né?”. O cearense está há 58 dos seus 75 anos no ramo.
Calixto conta que, quando foi maître no Esporte Clube Pinheiros, esse era o sistema adotado no local. “Há 40 anos atrás já era assim, a caixinha já caía na folha. Fomos beneficiados quando aconteceu isso”. No restaurante que trabalha hoje, a gorjeta é paga de maneira integral e por fora.
O advogado trabalhista Marcel Daltro acompanhou uma série de processos na justiça sobre o tema e disse que as decisões variavam em cada estado. “Era um tema bastante sensível porque nem o funcionário tinha as regras claras, nem o estabelecimento”.
“A gente se deparava com discussões astronômicas. Vi casos de estabelecimentos que foram fechados por causa de condenações na ordem de 80, 90 mil reais”, contou o advogado. Do lado do trabalhador, a reclamação frequente era que o empregador não repassava tudo o que era arrecadado.
Para o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de São Paulo (Abrasel-SP), Percival Maricato, a lei é importante porque “impede interpretações divergentes de juízes do trabalho, empresários e trabalhadores”.
Ainda assim, ele acredita que, como toda nova lei, podem surgir divergências. “Os funcionários que recebem os 10% integral vão reclamar. Ainda que melhore outros aspectos, como aposentadoria, ele vai receber menos”.
A operadora de caixa Fernanda Moraes acha a mudança negativa (Foto: Paula Paiva Paulo/G1)
Isso é o que contesta a auxiliar de cozinha de um restaurante na Rua Ignácio Pereira da Rocha, na Vila Madalena, Naiara dos Santos. “O ruim é descontar [da folha de pagamento]. A gente já contava com aquele dinheiro para as contas”, disse a funcionária que recebe o valor referente aos 10% a cada 15 dias. “Única coisa que é boa é no fundo de garantia ou seguro-desemprego”, pondera.
A operadora de caixa Fernanda Moraes, que trabalha em um restaurante de Pinheiros, considera a mudança negativa. “Como não entra como receita [para o empregador], ele não vai ter desconto e o funcionário vai?”, questiona.
De fato, o valor arrecadado como gorjeta não entra na receita dos estabelecimentos. Mas, por fazer uma administração temporária desses valores, eles terão gastos. “Justamente para cobrir essas despesas, encargos sociais, incidências trabalhistas, vai ter um desconto [na folha de pagamento]”, explica o advogado trabalhista.
O desconto na folha de pagamento em relação ao valor arrecadado de gorjeta pode ser de até 20% para quem é optante do Simples Nacional – regime tributário diferenciado que contempla empresas - e de até 33% para os que estão fora do Simples.
Entenda a nova lei
A lei nº 13.419 altera pontos do artigo 457 da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT). Para o advogado trabalhista Marcel Daltro, a regulamentação da distribuição da gorjeta irá diminuir “consideravelmente” os problemas. Segundo ele, a média do valor de um processo nessa esfera vai de 10 a 30 mil reais.
Algumas questões de procedimento ainda serão definidas em convenções coletivas, como quem tem direito ao valor arrecadado. Há estabelecimentos em que todos recebem (cozinha, caixa), e em outros apenas os que trabalham no salão.
As empresas com mais de 60 funcionários terão que formar uma “comissão de empregados” para o acompanhamento e fiscalização da regularidade da cobrança e distribuição da gorjeta.
O texto ainda estabelece que se a empresa tiver cobrado gorjeta por período maior que um ano e decidir acabar com a cobrança, a média dos valores recebidos pelo funcionário nos 12 meses anteriores deverá ser incorporada ao salário do empregado.
O empregador que descumprir a nova lei terá que pagar ao trabalhador prejudicado, a título de multa, o valor correspondente a 1/30 da média da gorjeta por dia de atraso.
Fonte: G1
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