Dez votos vão decidir o futuro de uma cidade neste domingo (1º). Foi esse o número de vereadores que sobrou em Foz do Iguaçu, a cidade
das Cataratas, quase sem Câmara e ainda sem prefeito.
"É uma confusão generalizada. Foz virou piada", diz a servidora pública Francielly Ponzio, 34.
Duas semanas atrás, mais da metade dos vereadores foi presa, suspeita de receber um "mensalinho". O prefeito foi detido meses antes pela Polícia Federal, também sob acusação de corrupção.
Entre eles, havia seis reeleitos para o colegiado de 15 vereadores que inicia o mandato em 2017. Um foi libertado porque estava em regime de prisão temporária. Os outros continuam atrás das grades. Ao todo, portanto, apenas dez vereadores estão, neste momento, aptos a definir os rumos de Foz.
A vice assumiu em julho, num mandato tampão -e Paulo MacDonald (PDT), que assumiria o seu lugar, eleito em outubro, teve a candidatura indeferida pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na semana passada por ter sido condenado por improbidade.
"Eu estava com equipe pronta, tudo pronto na minha cabeça. Agora, não tem mais jeito", diz MacDonald (PDT).
A cidade terá que fazer novas eleições. Ainda não está definido, porém, quando, nem quem serão os candidatos -e ainda há recursos a serem julgados.
DISPUTA
"Ainda não é jogo jogado. Não acabou", diz o segundo colocado, Chico Brasileiro (PSD). Para ele, a Constituição ainda admite que ele tome posse, já que o primeiro lugar não fez a maioria absoluta dos votos.
Até a decisão definitiva, o presidente da Câmara é quem assume a prefeitura. O problema é escolhê-lo, entre apenas dez vereadores que sobraram.
Dois grupos -o do ex-prefeito MacDonald e do seu adversário, Brasileiro- disputam a vaga, mas nenhum tem maioria ou consenso para eleger a chapa.
Entre eles, correm soltos os cálculos de quantos votos e até quantos anos têm: em caso de empate, vence o mais velho.
"Estão falando muita coisa, mas não há nada certo", comentava o vereador eleito Celino Fertrin (PDT), a dois dias da posse. Os oito novatos ainda tentavam articular um nome de consenso até este sábado, sem sucesso.
Na prática, desde a meia-noite, Foz é uma cidade sem comando.
CIDADE PARADA
"Eu não mandei ninguém embora porque podem precisar da equipe", diz a atual prefeita, Ivone Barofaldi (PSDB). "Eles estão totalmente sem time, sem nada. Não dá para fazer uma loucura."
Conhecida na cidade como dona Ivone, a empresária, que tem uma loja de calçados, diz estar distante de Reni Pereira (PSB), o ex-prefeito preso e afastado, há pelo menos dois anos, por desconfiar "dessas coisas desagradáveis, para não falar o nome".
"Eu fui usada para ganhar votos. Acreditei nele e depois fiquei de lado", diz. "Não sabia de absolutamente nada."
A cidade tem obras paradas, especialmente de recapeamento -elas são investigadas por suspeita de superfaturamento.
A saúde, outro alvo das investigações, também travou. O hospital municipal, quase ao colapso, foi assumido pelo governo estadual no mês passado.
Nesse cenário, os moradores se dividem sobre o que vai acontecer a partir de 2017. Para alguns, a investigação pode ter um "efeito pedagógico".
"O recado está sendo dado. É o fim de um ciclo político que era permissivo com a barganha, com a negociata", diz Brasileiro. Para ele, os novos vereadores, a maioria novatos, podem "reescrever a história da cidade".
Outros são mais reticentes. "Eu temo pelo futuro de Foz. Tenho medo que aconteça tudo de novo", diz MacDonald.
Há ainda quem fique no meio do caminho, como o taxista Fabiano da Silva, 29: "Podem até roubar, mas, depois do que aconteceu, vão roubar menos".
A eleição na Câmara acontece neste domingo (1º) à tarde.
ESQUEMA
O esquema descoberto em Foz do Iguaçu surpreendeu os investigadores. Segundo o Ministério Público Federal, o objetivo era dar sustentação política ao ex-prefeito Reni Pereira (PSB) por duas vias: acertos com empresários, que ganhavam licitações fraudulentas, e com vereadores, pagos em troca de apoio político.
A propina era paga até em lugares insólitos. Segundo o ex-secretário e atual delator, Melquizedeque Souza, a pergunta "Posso ir ao banheiro?" era a senha para que um empresário deixasse o valor no toalete do seu gabinete.
Alguns vereadores recebiam até R$ 10 mil por mês, fora outros pagamentos eventuais.
OUTRO LADO
Para a defesa dos vereadores, há excessos na investigação."O judiciário quer passar um corretivo nos políticos, numa onda de moralização, mas é preciso um julgamento justo", diz o advogado Silvio Alvarenga, que defende sete dos investigados no esquema. "Ninguém defende a impunidade ou é a favor da corrupção, mas eles estão cumprindo pena antecipadamente."
Os vereadores presos haviam sido diplomados um dia antes. Na cadeia, foram recebidos aos gritos por outros detentos. Tiveram a cabeça raspada e estão sem visitas da família. Passaram o Natal à base de carne assada, arroz sem legumes, macarronada e salada de batata.
Para Alvarenga, as provas são frágeis, baseadas nas palavras de colaboradores e em escutas fora de contexto. Ele destaca que o caso ainda está em fase de inquérito -portanto, ninguém foi denunciado, muito menos condenado.
O ex-prefeito Reni Pereira vem afirmando inocência desde o início das investigações. Ele está em liberdade há dois meses por decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), mas não pode ir à prefeitura nem manter contato com qualquer funcionário do executivo. Pereira virou réu, mas ainda não houve decisão no processo.
Para sua defesa, o caso é "complexo e difícil" porque envolve familiares do ex-prefeito, inclusive sua mulher, a deputada Claudia Pereira (PSC), e as provas colhidas até aqui só corroboram uma parte da acusação, que ainda é passível de questionamento.
Fonte: Folha de São Paulo
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