A indenização das famílias das vítimas da tragédia da Chapecoense tornou-se uma questão em aberto por conta da
fragilidade da empresa aérea Lamia, dona do avião que caiu. Se a empresa não tiver capacidade de pagar, essa obrigação recairá sobre o clube catarinense que tem responsabilidade sobre seus empregados, segundo advogados. Isso pode ocasionar um rombo que dificulte a vida financeira do time.
A tragédia configura um acidente de trabalho. Assim, os familiares dos funcionários do clube têm direito a uma indenização pelo prejuízo financeiro que terão sem os rendimentos da pessoa que morreu no acidente. A primeira a ser cobrada é a companhia aérea. Mas, se esta não conseguir pagar, a responsabilidade será da Chapecoense por tê-la contratado para transportar empregados.
"Há a figura do acidente de trajeto que se equipara ao acidente de trabalho. Quando o empregado está indo ou voltando, é considerado acidente de trabalho. O empregador é o responsável", contou o advogado Luiz Roberto Leven Siano, que atua na área trabalhista e de transporte internacional. "O TST (Tribunal Superior do Trabalho) já estabeleceu precedente que entende que o empregador que arruma o transportador tem responsabilidade objetiva, ou seja, é equiparado ao transportador."
O mínimo estabelecido para indenizações por acidentes aéreos é de R$ 520 mil (ou 100 mil direitos especiais) pela convenção de Montreal. Mas esse valor é considerado mínimo em todo mundo, e a Justiça brasileira já tem decisões que elevam bastante o montante ao considerar toda a vida produtiva da vítima.
Os valores somente para os jogadores (sem contar comissão técnica e diretoria) poderiam chegar a R$ 140 milhões, de acordo com as contas do advogado. O cálculo é feito baseando-se na soma do salário mensal de cada atleta até completar 35 anos, prazo médio para a aposentadoria de atleta, com o pagamento de dois salários mínimos e meio (média do brasileiro) até 68 anos. Cada um teria um valor de acordo com a idade e seu salário.
A Chapecoense não teria que se preocupar em arcar com esse custo se tivesse contratado uma companhia aérea de grande porte. Grandes empresas de aviões costumam contratar seguros de até US$ 1 bilhão. No entanto, a Lamia contratou o seguro junto à empresa Aon para o valor de apenas US$ 25 milhões (cerca de R$ 70 milhões), como informou a BBC. Dessa forma, o valor restante seria de responsabilidade do clube.
"Se perceber a culpa do transportador (Lamia), e há vários indícios disso, a seguradora pode não pagar. Se houver um erro técnico, ela paga. Mas, se houver má fé do piloto, a seguradora pode não pagar", contou o advogado Paulo Henrique Cremoneze, especialista em transporte de cargas. "O problema é que a companhia não é grande. Não deve ter condições de arcar. Aí vai criar esse trauma entre o clube e as famílias porque o TST já reconheceu que o empregador responde como transportador."
O clube já se prepara para um rombo financeiro caso as famílias desejem brigar na Justiça pelas indenizações. Parte da diretoria foi informada que alguns advogados já estão assediando os parentes das vítimas para que elas processem o clube.
Os seguros contratados pela agremiação e pela CBF vão amenizar a situação das famílias, mas provavelmente não serão suficientes. No caso da Chape, o valor pago a cada família será de 28 vezes o salário de cada jogador. No caso da CBF, será mais um ano de salário com teto de R$ 1,2 milhão. Isso é completamente independente da indenização: é apenas o seguro obrigatório mínimo de um ano de salário.
Por isso, a Chapecoense espera contar com a ajuda da Fifa e da CBF, que já prometeu R$ 5 milhões. Se for necessário, vai reverter a renda do jogo beneficente entre Brasil e Colômbia, que está sendo programado, para o pagamento de indenizações.
"Por isso que prevemos que por mais que tenha jogo beneficente que dê uma boa renda ainda assim nós vamos nos incomodar por muito tempo", admite o vice jurídico da Chapecoense, Luiz Palaoro.
A diretora acha justo as famílias receberem pelo que lhes forem de direito, mas tenta filtrar a atuação de advogados que considera aproveitadores. Por isso, já entrou em contato com a OAB para que disponibilize profissionais para os parentes sem custo.
"Tem muitos aproveitadores. Tem muitos escritórios de São Paulo e do Rio procurando as famílias, o que é grave explorar a desgraça alheia em um momento de fragilidade. A Justiça não serve para enriquecer um e para empobrecer outro, ela tem que fazer justiça. Tem que ter critérios para aplicar um valor justo. Estamos tentando convencer as famílias, mas mais que isso não podemos fazer. Sempre tem alguém que pode discordar do encaminhamento e pensar em ganhar mais", afirmou.
Fonte: Uol
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