Nos últimos três anos, a maioria dos jornalistas do Egito teve de aprender a tomar cuidado com o que diz e a atenuar o tom de suas
reportagens a fim de manter seus empregos em um governo dominado pelas forças armadas.
Agora, o Estado está ordenando que algumas mulheres que trabalham como âncoras em telejornais pratiquem contenção semelhante quanto ao peso.
No começo da semana, Safaa Hegazy, diretora da rádio e TV estatal egípcia, barrou oito apresentadoras de aparecer na TV por um mês, afirmando que elas estão com excesso de peso, confirmou o site oficial de notícias Al-Ahram. Hegazy ordenou que as mulheres fizessem dieta durante o período de suspensão.
Khadija Khatab, uma das oito apresentadoras, disse não ter sido formalmente notificada da ordem de Hegazy, mas acrescentou ter sido informada recentemente de que "medidas seriam tomadas" contra as apresentadoras que não conseguissem perder peso até a metade de setembro, de acordo com uma entrevista que ela deu a um canal privado de TV.
Khatab disse ainda que ficou ofendida por a cobertura de sua situação ter incluído termos como "gorda" e sinônimos, algo que ela definiu como "injusto" e "insultuoso". Ela também disse que as fotos dela que vêm circulando na internet e em sites de mídia social –e gerando zombarias– são antigas e que ela perdeu peso desde que foram tiradas.
"Acredito ser uma mulher egípcia comum, e que pareço normal; não uso muita maquiagem", disse Khatab, desafiando as pessoas a contradizê-la. Muitas o fizeram.
Alaa el-Sadani, comentarista do Al-Ahram, disse que estava "enojada" pela aparência "repulsiva e repelente" das oito apresentadoras suspensas, e que acreditava que o resto do país concordasse com ela.
Fatma al-Sharawy, outra jornalista do Al-Ahram, recebeu positivamente a medida, como forma de melhorar os índices horrendos de audiência dos canais estatais de TV egípcios. "Será que basta suspender oito?", questionou ela.
A audiência da TV estatal, que muitos egípcios descartam como fonte de notícias por sua cômica parcialidade, caiu significativamente depois do levante que tirou do poder o presidente Hosni Mubarak, em 2012.
"Não compreendem que as pessoas não assistem ao canal porque eles não têm credibilidade, capacitação ou qualidade", disse Mostafa Shawky, defensor da liberdade da imprensa e membro da Associação pela Liberdade de Pensamento e Expressão. "Não tem a ver a ver com a aparência. Mas serve para mostrar que competência real não é algo com que eles se importam."
Shawky disse que as suspensões reforçaram a impressão generalizada, no Egito, de que apenas mulheres que atendem a um determinado padrão de beleza deveriam trabalhar no jornalismo televisivo. "O fato de que uma mulher tomou essa decisão torna tudo ainda pior."
Hegazy não foi localizada para comentar.
Fonte: Folha de São Paulo
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