Eduardo Cunha (PMDB-RJ) começou a rascunhar sua carta de renúncia à presidência da Câmara no início desta semana, quando ainda negava veementemente
qualquer disposição em fazê-lo.
Passou os últimos dias ajustando o texto e finalizou o documento na madrugada desta quinta-feira (7).
O deputado afastado recebeu a visita de aliados tanto na madrugada como no início da manhã, horas antes de tornar pública sua decisão. Parlamentares próximos a ele que já não estavam em Brasília receberam um telefonema. "Vou fazer o que vocês querem", disse Cunha, segundo aliados.
Foi um estrategista até o fim, mesmo na derrocada. Escolheu a data da divulgação da carta de olho no calendário da sucessão da Câmara.
Enfraquecido, deixou de resguardar sua decisão quando houve garantia de que um acordo de líderes propiciaria uma troca rápida do comando da Casa —não queria o interino, Waldir Maranhão (PP-MA), presidindo a votação de sua cassação, já aprovada pelo Conselho de Ética.
Numa tentativa de minimizar a impressão de que está cada vez mais isolado, fez questão de não aparecer sozinho durante o anúncio. Por volta das 10h, o deputado Hugo Motta (PMDB-PB), um de seus aliados mais fiéis, começou a disparar telefonemas.
"Está em Brasília?", perguntava. "Cunha vai falar às 13h na Câmara. Vamos receber ele na entrada", pedia. Cerca de 15 parlamentares atenderam ao chamado. Cunha chegou à Câmara pouco depois das 13h, com um meio-sorriso no rosto.
Sua expressão se manteve intacta durante o trajeto até o Salão Nobre da Casa, local que escolheu para ler seu pronunciamento, mesmo quando foi chamado de "ladrão" e vaiado por assessores de outros deputados.
O horário do anúncio foi o último detalhe definido. O Palácio do Planalto e o presidente interino, Michel Temer, receberam a confirmação minutos antes da fala de Cunha. Mas, desde a quarta (6), já sabiam que ele não passava do dia seguinte no posto de comandante da Câmara.
Durante o dia, aliados e assessores repetiram que Temer "soube pela imprensa" da decisão do correligionário, mas o fato é que o interino teve papel de proa na construção da saída de Cunha do cargo.
Os rumores sobre a renúncia só deslancharam após uma conversa privada entre Temer e o deputado afastado, há cerca de 15 dias.
Foi quando Cunha verbalizou que aceitaria renunciar ao posto na Câmara, desde que tivesse apoio do Planalto para tentar reverter a tendência de cassação do seu mandato.
COMPANHIA
Nas horas que precederam o anúncio, Cunha contou com a companhia da mulher, a jornalista Cláudia Cruz. Foi ao fazer menção a ela e à filha que o deputado afastado perdeu pela primeira vez a compostura diante das câmeras e chorou.
Cláudia, dizem amigos, não se afastou de Cunha durante o processo. Preferiu, no entanto, ficar em casa a ir até a Câmara para o comunicado da renúncia.
Cláudia e Cunha, agora, vão preparar a mudança da casa, que irá abrigar o próximo presidente da Câmara.
Ao ser eleito, no ano passado, o deputado afastado levou para a luxuosa mansão, que fica num local conhecido como "península dos ministros", em Brasília, parte de seu mobiliário pessoal, como tapetes, mesas, porta-retratos e sua adega de charutos.
Num último gesto simbólico, Cunha decidiu deixar a Câmara pela "porta da frente". Depois de renunciar, desceu a rampa do Congresso ao lado de seguranças. Chegou a acenar, como se estivesse tomando posse. Antes de entrar em seu carro, deu uma última palavra: "Tchau", e bateu a porta.
Fonte: Folha de São Paulo
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