Uma grande corrida de grupos de pesquisa está em curso para o desenvolvimento de uma vacina antigripe universal, que proteja
contra todas as cepas do influenza.
Há ao menos 31 candidatas em testes, a grande maioria ainda na fase pré-clínica (antes de testes em humanos), segundo revisão de estudos publicada na revista "Vaccine", no final de março.
As pesquisas miram numa parte estável do vírus, igual em todos os casos de gripe, independentemente dos subtipos ou das mutações que frequentemente ocorrem. Não há previsão de quando o produto chegará ao mercado.
As vacinas que hoje as pessoas buscam freneticamente nas clínicas de imunização, ou a que é distribuída na rede pública, são consideradas pouco eficazes, com índice médio de proteção de 60%. Ou seja, de cada dez pessoas, quatro poderão ficar gripadas mesmo tomando a vacina.
Entre os imunodeficientes, como transplantados, pessoas fazendo quimioterapia ou pacientes com HIV, a taxa de proteção é ainda menor, em torno de 30%.
"Justamente entre aqueles que ela mais precisaria ter eficácia é que apresenta pior desempenho", diz o infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).
A vacina antigripe se baseia em previsão da Organização Mundial da Saúde sobre quais sorotipos do vírus influenza atingirão a população naquele ano –em 2016, são dois A e um B na trivalente e dois A e dois B na tetravalente.
Essas duas linhagens respondem por 10% de todos os vírus circulantes. Há mais 200 que podem causar sintomas gripais parecidos, como febre, dores de cabeça e no corpo, tosse e secreção nasal.
A eficácia da vacina depende do grau de acerto dessa previsão, ou seja, se o vírus sofrer mutações entre a fabricação e a distribuição, a vacina se tornará menos eficaz.
Nos últimos sete anos, por exemplo, em metade das temporadas de gripe, a linhagem B recomendada para as vacinas foi diferente das cepas circulantes, segundos dados da Sanofi Aventis, fabricante da vacina tetravalente.
Além disso, as vacinas geram proteção por tempo limitado, em torno de seis meses. "Infelizmente, elas protegem contra poucos tipos de vírus e por um curto período de tempo", diz o infectologista Esper Kallás, professor da USP.
PONTAS E HASTES
Em razão dessas e outras limitações é que se recomenda hoje a vacina para grupos específicos (idosos e crianças pequenas, por exemplo) e que se busca um modelo de imunização universal. O foco dos estudos é uma proteína (hemaglutinina), que fica na superfície do influenza e que permite a sua fixação às células do sistema respiratório.
Segundo o virologista Celso Granato, professor da Unifesp (Federal de SP), as atuais vacinas têm como alvo a ponta dessa proteína. Ocorre que ela sofre mutações constantes, o que leva a vacina a ser reformulada todos os anos.
Imagine que o vírus seja uma bola com vários pirulitos espetados nela. A ponta (o doce) muda todos os anos, mas as hastes permanecem estáveis e são iguais em todos os casos de gripe.
É nessa haste que os estudos sobre as novas vacinas têm se fixado. "O potencial a médio prazo é grande. Basta que se consiga estabilizar a parte não variável do vírus para que seja reconhecida pelo sistema imune", diz Kallás.
Para Renato Kfouri, apesar de estudos sobre a vacina universal estarem "engatinhando", a necessidade é urgente. "É insano todo ano você predizer o vírus que vai circular, cultivar esse vírus em ovos, e, por fim, a vacina chegar a tempo de ser distribuída."
NOVO MODELO
Nos últimos anos, em busca de uma vacina universal, os pesquisadores já tinham tentado a estratégia de centrar esforços na parte não variável do vírus influenza. Mas, quando retiravam a parte que muda todos os anos, o restante ficava inviável para pesquisas.
No ano passado, porém, resultados de dois estudos foram bastante promissores. Cientistas americanos conseguiram reproduzir a haste (parte não variável) e acoplá-la a nanopartículas que serviram como esqueleto para manter a estabilidade do conjunto. A candidata a vacina foi testada em camundongos e furões. Os resultados mostraram que ela protegeu totalmente os camundongos e parcialmente os furões.
Uma outra linha de pesquisa envolveu um grupo da Holanda, que criou um antígeno chamado mini-HA, que demonstrou capacidade de imunizar camundongos e reduzir sintomas em macacos.
Em relação à produção, considerada antiquada –por envolver o cultivo do vírus em ovo, por exemplo– linhas de pesquisa buscam, dentro da engenharia genética, alternativas para modernizá-la.
"O método é contraproducente, caro, demanda custo de produção e operacionalização para distribuí-la. A meta é conseguir uma vacina que não precisa ser mudada a cada hemisfério, a cada temporada", diz o infectologista Renato Kfouri, vice da Sociedade Brasileira de Imunizações.
Fonte: folha de São Paulo
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