O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Edson Fachin defendeu nesta quarta-feira (16) que o Senado seja obrigado a instaurar o impeachment caso a
Câmara autorize, por 2/3 de seus membros (ao menos 342 dos 513 deputados), a abertura do processo.
Relator da ação que questiona as regras para processar um presidente da República, Fachin foi o primeiro dos 11 ministros a votar numa ação do PC do B que anular a decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que aceitou uma denúncia por crime de responsabilidade contra a presidente Dilma Rousseff no último dia 2 de dezembro.
Depois do voto, a sessão foi encerrada e o julgamento deverá ser retomado nesta quinta (17). Até a decisão final do STF, continuará suspenso o processo de impeachment no Legislativo.
Em seu voto, Fachin disse que "inexiste competência do Senado para rejeitar autorização expedida pela Câmara dos Deputados" para instaurar o processo.
"O comando constitucional é claro ao indicar, no art. 86, que 'admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento', não havendo faculdade da Mesa do Senado, pois, quando recebe a autorização, deve ela instaurar o processo", afirmou durante o voto.
Conforme a Constituição, somente após a instauração do processo pelo Senado é que o presidente da República deve ser afastado do cargo, por até 180 dias, até o julgamento final sobre o impeachment, também a cargo dos senadores. Segundo Fachin, a suspensão ocorre depois da leitura da decisão da Câmara no plenário do Senado.
A possibilidade de o Senado recusar a instauração do processo, evitando o afastamento da presidente, foi um dos principais pedidos do PC do B na ação em julgamento no STF para definir o rito do impeachment a ser seguido pelo Legislativo.
A questão colocou em confronto as próprias Casas do Congresso: em sua manifestação, a Câmara defendeu que a decisão dos deputados determina a abertura do processo. O Senado, por sua vez, afirmou que a Casa não precisa seguir a decisão dos deputados, entendimento também manifestado pela Presidência e pela Procuradoria Geral da República.
A decisão final será dada pela maioria dos 11 ministros do Supremo. Depois de Fachin, ainda votam os ministros Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.
Defesa prévia
Fachin também se manifestou nesta quarta contra a necessidade de defesa prévia da presidente da República antes do recebimento, pelo presidente da Câmara, de um pedido de impeachment, passo inicial do rito.
A posição contraria pedido do PC do B para anular a decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que acolheu uma denúncia por suposto crime de responsabilidade contra a presidente Dilma Rousseff, no último dia 2 de dezembro. Como Dilma não foi ouvida antes, o partido quer que o STF anule o processo de impeachment.
"O recebimento operado pelo presidente da Câmara constitui juízo primário e não há obrigatoriedade de defesa prévia. Deve ser autorizada ao acusado defesa prévia [na análise do processo] na comissão especial. A ausência de defesa prévia não viola o devido processo legal. Razão pela qual defendo indeferir a cautelar", disse Fachin.
Para o ministro, a presidente da República terá oportunidade de se defender durante a fase de elaboração do parecer pela comissão especial, formada por deputados, que irá recomendar ao plenário da Câmara a abertura ou não de um processo de impeachment.
Fachin também votou para negar pedido do PC do B para que o acolhimento do pedido de impeachment seja anulado devido à suposta "parcialidade" de Eduardo Cunha. O partido alega que o peemedebista deu aval ao pedido de afastamento de Dilma em retaliação ao PT por não ter obtido apoio da legenda na votação, no Conselho de Ética, de processo que visa cassar seu mandato.
"Eventual parcialidade com maior razão não afetará o mero juízo preambular da admissibilidade da denúncia. Será discutido em nível colegiado [a admissibilidade] do processo. Portanto, entendo que as causas de impedimento e suspeição não se compatibilizam com o processo jurídico-político, bem como não há subsidiariedade na produção das provas de parlamentares", afirmou.
Formação da comissão
O ministro Fachin também rejeitou pedido para anular a eleição da comissão especial. O PC do B questionava o fato de a chamada chapa da oposição – formada por indicações avulsas dos partidos – ter sido eleita por voto secreto. Para a legenda, a votação deveria ser aberta.
Fachin reconheceu que a regra geral é de votação aberta para qualquer decisão. Ele disse, porém, que a formação de comissões é regida pelos regimentos da Câmara e do Senado. O regimento da Câmara diz que eleições no âmbito da Casa, como para a Mesa Diretora, devem ocorrer por votação secreta.
"Não obstante apenas em excepcionalíssima hipótese seja secreta, entendo que no presente o caso não há ofensa na interpretação do regimento de que a votação seria secreta. Observo que as comissões são constituídas nas formas previstas no regimento. É o que autoriza o regimento. Isso significa que a formação das comissões deve ser feita conforme o regimento das Casas", afirmou.
Fachin também rebateu argumento do PC do B de que não poderia haver chapa avulsa na eleição para a comissão especial. Para a legenda, só poderiam concorrer deputados indicados oficialmente pelos líderes dos partidos. O ministro, porém, destacou que uma "eleição" pressupõe a participação de mais de uma chapa na disputa.
Segundo Fachin, a votação deve ser aberta quando o processo chegar ao plenário da Câmara, quando todos os deputados votam o parecer da comissão especial. Para autorizar o procedimento, é preciso o voto favorável de 342 (2/3) dos 513 deputados.
"Uma vez encerrada a discussão deverá o parecer ser submetido à votação nominal e extensiva. Para ser admitida a denúncia, precisa ser autorizada com voto de dois terços dos membros da Câmara", afirmou Fachin.
'Controle de legalidade'
Ao iniciar seu voto, Fachin afirmou que o impeachment decorre "do regime republicano e democrático", pela "possibilidade de responsabilização do mandatário máximo da nação". Depois de diferenciar o impeachment da moção de desconfiança do regime parlamentarista, afirmou que cabe ao STF verificar a regularidade do rito do processo.
“Ao Supremo Tribunal Federal compete o controle da estrita legalidade procedimental do processo de impeachment, assegurando que o juízo jurídico-político de alçada do Parlamento, passível de controle judicial apenas e tão somente para amparar as garantias judiciais do contraditório e ampla defesa se desenvolva dentro dos estritos limites do devido processo legal”, afirmou.
Fachin destacou que o Supremo não pretende criar normas para o processo de impeachment, mas sim fazer uma “filtragem constitucional” das regras atualmente existentes. “Não cabe ao Supremo editar normatização sobre a matéria e aqui nem de longe de propõe edição normativa. Ao contrário, o que se propõe é filtragem constitucional.”
Conforme informou na semana passada, ele deverá propor um rito por inteiro do processo de impeachment. Mais cedo, a Globo News havia andiantado que o ministro iria propor que o Senado seja obrigado a manter e julgar o processo caso a Câmara autorize a tramitação.
AGU
A fala de Fachin ocorreu após a defesa do governo, feita pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams. Ele defendeu o poder do Senado para recusar a abertura de um processo de impeachment, mesmo com a decisão da Câmara de autorizar o julgamento do presidente da República. "Não é o Senado Casa cartório para receber as demandas e simplesmente acatá-las", disse.
Adams também argumentou que a decisão da Câmara é apenas "condição" para instauração do processo, que cabe aos senadores, em sua visão. “A Câmara é condição de admissibilidade, mas ela autorizando não afasta nem do Senado nem do Supremo o direito e dever de examinar os autos e o processo para avaliar essa admissibilidade e garantir o devido processo legal. É um juízo compartilhado. Uma decisão complexa de duas Casas”, afirmou.
A defesa do poder do Senado para recusar o impechment coincide com manifestação que o próprio Senado entregou ao STF na semana passada. Também concordam com essa tese o PC do B, autor da ação, e a Procuradoria Geral da República.
Adams destacou que as etapas intermediárias do processo de impeachment têm consequências “gigantescas” e, por isso, é preciso haver decisão favorável tanto da Câmara quanto do Senado para a instauração do processo.
Ele lembrou que uma das consequências da instalação do procedimento é o afastamento por seis meses da presidente.
“No impeachment as consequências relativas ao presidente são gravíssimas, nas decisões intermediárias. A admissão do processo afasta o presidente por seis meses. Se admitida a denúncia contra o presidente da Câmara, ele não será afastado. Mas o presidente da República é afastado”, destacou.
Câmara
Antes de Adams e falando pela Câmara, o deputado federal Miro Teixeira (PROS-RJ) defendeu que a decisão da Câmara, por 2/3 de seus membros, seja obrigatoriamente seguida pelo Senado para instaurar o processo.
“A Câmara pratica o juízo de admissibilidade. O Senado julga. Será que a Câmara tem esse trabalho, de aprova por dois terços, e o Senado ignorar? O que diz a Constituição, a Câmara autoriza e o Senado julga. É um procedimento difícil. Dois terços dos votos, são raros são os dispositivos que preveem dois terços”, afirmou.
Nas manifestações ao Supremo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que acolheu o pedido contra a presidente Dilma Rousseff, fez a mesma defesa. "A denúncia será analisada pela Câmara dos Deputados, o que dispensa nova análise de uma absurda revisão pela Mesa do Senado Federal", diz parecer da Câmara.
Julgamento
Na ação em julgamento nesta quarta, o PC do B argumenta que várias regras da lei de 1950 devem se adaptar à Constituição de 1988. Além disso, defende que as regras dos regimentos da Câmara e Senado sejam derrubadas, argumentando que o rito só pode ser definido por lei específica.
O partido foi o primeiro a se manifestar no julgamento, iniciado na tarde desta quarta-feira (16). O advogado Claudio de Souza Pereira Neto, que representa o partido, afirmou na sustentação oral perante a Corte, que a "banalização" do processo de impeachment pode gerar “instabilidade” política e econômica no país.
O PC do B questiona não só atos já realizados – caso do acolhimento do pedido de impeachment – como também outros que ainda estão por vir, inclusive no Senado, que irá julgar se houve ou não crime de responsabilidade.
O partido alega que a presidente Dilma deveria ter tido oportunidade de se defender antes. Além disso, o PC do B defende que o Senado possa recusar a abertura efetiva do processo antes do julgamento final. Só depois, disso, argumenta o partido, a presidente poderia ser afastada, por até 180 dias, até o julgamento final sobre o mandato da presidente.
Fonte: G1
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