Apesar de ter herdado parte do nome e do elenco, o novo “Zorra” se parece muito pouco com o antigo programa que permaneceu na grade da Globo por 15 anos. O
terceiro episódio, exibido há uma semana, deixou isso bem claro.
Um dos quadros, relativamente longo, mostrou um advogado lendo o testamento deixado por um milionário para a sua família. A piada ficou para o final, como é praxe. Um dos filhos não herdou nenhuma propriedade ou dinheiro, mas um político – um deputado que resolvia os problemas do milionário.
Encerrado o esquete, apareceu Valéria, a personagem celebrizada por Rodrigo Sant'Anna, em dupla com Janete (vivida por Thalita Carauta), um dos grandes sucessos do velho “Zorra”. E ele disse só uma frase: “Mas me tiraram do ar pra isso?”
Neste mesmo sábado, o programa começou com um casal na mesa de um restaurante escolhendo a sobremesa. “Ih, tem pavê”, diz a mulher. “Mas é pra ver ou pra comer?”, pergunta o homem. Dois outros homens surgem do nada e dizem: “Boa noite, nós somos da fiscalização. Lamento informar, mas o senhor será multado porque o senhor foi pego em flagrante fazendo uso de uma piada com data de validade vencida”.
Ainda neste terceiro episódio, um outro quadro, bem rápido, me chamou a atenção. Um casal de idosos está no interior de uma igreja. Ela: “Tá rezando, meu bem?” E ele: “Tô aqui vendo se consigo alcançar a graça na próxima cena”.
Não é por acaso que, em um único episódio do “Zorra”, três quadros tenham tratado do conteúdo do próprio programa. O que é engraçado? O que é clichê? O que é piada velha?
Acho corajoso a equipe dividir com o público estas questões. Além de mostrar que sabem rir de si mesmos, uma grande qualidade, os responsáveis pelo “Zorra” estão dizendo que é preciso renovar, mas não existe “A'' fórmula para um bom programa de humor.
A Globo vem abrindo espaço, nestes últimos anos, para diferentes experiências neste segmento. “Junto e Misturado” (2010 e 2013) foi considerado ousado demais e popular de menos. “Casseta e Planeta Vai Fundo” (2012), ao contrário, fracassou justamente porque, ao invés de reformar, foi fiel em excesso ao antigo humorístico da turma. “Divertics” (2013-14), apesar da fórmula inovadora, desandou na realização.
De todos estes mais recentes, de longe, o mais bem-sucedido foi “Tá no Ar” (2014-15), com a sua proposta de rir da própria televisão com um humor afiado. Não à toa, parte da equipe envolvida naquele projeto também está no “Zorra” – Marcius Melhem, Mauricio Farias, além de alguns atores e redatores.
Uma aposta ousada é no humor absurdo, que extrai graça de situações impossíveis. Como o piloto de avião que compartilha os mais variados detalhes de sua vida particular, incluindo suas relações com as comissárias de bordo, por meio do sistema de som.
Ou diretor da escola que chama Maria e José pra falar dos problemas causados pelo pequeno Jesus porque ele é uma má influência para outras crianças nas aulas de natação. “Essa mania que ele tem de ficar andando em cima da água. As outras crianças tentam fazer igual e afundam”, explica o diretor.
Não sem razão, houve quem visse influência do Porta dos Fundos (e também de Monty Python, The Kids in the Hall, Seinfeld etc) em alguns quadros.
Como observou Alexandra Moraes, na “Folha'', o novo “Zorra” também se destaca por ser “um programa sobre a vida real”, brincando com o que “há de mais irritante e dramático na rotina”. Vários quadros exploram com graça os absurdos do cotidiano – no comércio, em casa, no restaurante.
É possível que alguns espectadores concordem com Valéria e não entendam a razão da mudança, mas os índices de audiência mostram que o novo “Zorra” está sendo bem aceito. Os três primeiros episódios registraram média de 18 pontos, dois a mais do que a alcançada pela emissora, no horário, nas três semanas anteriores à estreia.
O desafio de agradar os velhos espectadores e conquistar novos parece estar sendo alcançado. Merecidamente.
Fonte: Uol
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