Duas mil interceptações telefônicas, resultado de dez meses de investigações, contêm conversas que comprovam a existência de
duas facções que ditam as regras e comandam crimes dentro e fora dos presídios do Rio Grande do Norte. As gravações também confirmam a existência de um elo entre mais de 150 presos encarcerados no sistema penitenciário potiguar e detentos do estado do Paraná. As informações são do juiz Henrique Baltazar, titular da vara de Execuções Penais do Rio Grande do Norte.
O magistrado, juntamente com juízes das comarcas de Caicó e Currais Novos, ambas no Seridó potiguar, foi um dos responsáveis por autorizar as escutas que fazem parte das investigações da Operação Alcatraz, deflagrada na manhã desta terça-feira (2) em 15 cidades do RN e que também cumpriu mandados nos estados de São Paulo, Paraná e Paraíba.
A operação foi batizada de Alcatraz em alusão ao nome da penitenciária americana instalada na ilha de Alcatraz, que no início do século XX recebia os chamados chefões do crime organizado. Ao todo, foram expedidos 223 mandados de prisão e 97 de busca e apreensão. A operação conjunta envolveu Ministério Público, Polícia Militar e Polícia Rodoviária Federal. No RN, os mandados foram cumpridos em Natal, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Currais Novos, Caicó, Assu, Parelhas, Lajes, Jucurutu, Jardim do Seridó, Jardim de Piranhas, São Vicente, Acari, Cruzeta e Santa Cruz.
Em entrevista ao G1, o magistrado revelou que, em média, foram autorizadas 200 interceptações por mês. "Os conteúdos das gravações ainda não podem ser revelados porque estão sob sigilo judicial, mas posso adiantar que os presos do Rio Grande do Norte, os que fazem parte de uma das facções, conversavam diariamente com presos do Paraná. Num determinado horário, eles faziam uma teleconferência por celular que chegava a reunir até 20 presos. Depois de cada um se apresentar, eram repassados relatórios sobre a atuação da organização. Foram gravadas conversas nas quais eram planejadas explosões a caixas de banco, compra e remessa de drogas e aquisição de armamento pesado. Em uma das gravações descobrimos a encomenda de fuzis para serem usados em assaltos. Algumas mortes foram discutidas e executadas", disse Baltazar.
Ainda de acordo com o juiz, as duas facções instaladas no RN surgiram a partir de uma organização criminosa que nasceu em São Paulo e depois se ramificou por praticamente todos os estados do país. "Aqui no RN começou assim. Depois esse grupo se dividiu e os dissidentes fundaram uma outra facção. As duas são rivais no Rio Grande do Norte e disputam o controle do tráfico de drogas. As duas também são responsáveis por uma vastidão de crimes que ocorrem no estado. O tráfico de drogas é o que dá mais dinheiro. É o carro-chefe dos negócios. Em consequência, e até para manter este negócio, ocorrem outros crimes, como explosões e arrombamentos a bancos, roubos a estabelecimentos comerciais e residências, furtos, sem falar em casos de execuções, homicídios que acontecem em razão da rivalidade e disputa pelo controle dos pontos de vendas de drogas", explicou.
Henrique Baltazar acrescentou que os presos identificados devem ser transferidos nos próximos dias. No Rio Grande do Norte a maior parte das transferências ocorrerão na Penitenciária Estadual de Parnamirim (PEP), que fica na Grande Natal, na Penitenciária Estadual do Seridó (Pereirão), na cidade de Caicó, e na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, em Nísia Floresta, a maior unidade prisional do estado.
"Alguns devem ser remanejados para outras unidades prisionais dentro do próprio Rio Grande do Norte. Outros, os considerados mais perigosos e de maior influência dentro das facções, devem ser levados para a Penitenciária Federal de Mossoró, na região Oeste do estado, e para outras penitenciárias federais do país", afirmou.
O juiz acredita que os presos do Paraná também devem ser remanejados, o mesmo ocorrendo que alguns que foram identificados em São Paulo e na Paraíba.
Líder
Um empresário paulista radicado em Natal, identificado como Robson, de 30 anos, é apontado como suspeito de liderar um dos esquemas de distribuição de drogas investigado pela operação Alcatraz. Segundo o Ministério Público, o suspeito é sócio de um salão de beleza localizado em uma área nobre da capital potiguar. As investigações indicam que ele comandava a distribuição de drogas no atacado, abastecendo a Grande Natal, além das regiões Seridó, Central e Vale do Açu. O MP acrescenta que o suspeito está envolvido em algumas das maiores apreensões realizadas neste ano no estado.
Uma das apreensões citadas pelo MP foi de 70 quilos de maconha no dia 20 de outubro em São José de Mipibu. A droga foi encontrada em um ônibus vindo de São Paulo. Outra apreensão aconteceu em Macaíba, onde foram apreendidos 20 quilos em um carro que estava a caminho da região Seridó. Nos dois casos, as prisões foram feitas pela Polícia Rodoviária Federal.
Há ainda a suspeita de que a mesma organização criminosa tenha sido fornecedora dos 100 quilos de maconha apreendidos pela Polícia Militar na cidade de Caraúbas em setembro deste ano.
O secretário estadual da Segurança Pública e da Defesa Social, general Eliéser Girão, afirmou que muitas denúncias foram recebidas sobre a atuação do crime organizado nos presídios. "Chegamos no limite do limite. Recebemos muitas denúncias com muita gente envolvida. Não poderíamos esperar mais", disse.
Ainda de acordo com o MP, as informações colhidas nos dez meses de investigação possibilitaram a realização de 75 prisões em flagrante feitas pela Polícia Militar e Polícia Rodoviária Federal. As prisões foram efetuadas por crimes de tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo e roubo.
A maior apreensão de drogas feita pela PRF no ano foi realizada a partir da investigação. Aconteceu no dia 18 de maio deste ano, na cidade de Dourados, estado do Mato Grosso do Sul, onde a Polícia Rodoviária Federal apreendeu 15,2 toneladas de maconha. O órgão ministerial afirma que parte expressiva da droga seria distribuída no Rio Grande do Norte.
Fonte: G1
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