O relatório final do inquérito da Polícia Civil sobre atos de violência em manifestações mostra que o grupo investigado tem uma
hierarquia rígida. Há comissões voltadas para o planejamento de ataques, confecção e distribuição de bombas, coquetéis molotov e ouriços (peças feitas com pedaços de vergalhões), que seriam lançados nas ruas para ferir PMs e furar os pneus das patrulhas. O documento do inquérito — que resultou na Operação Fire Wall — levou a Justiça a decretar, sexta-feira, a prisão preventiva de 23 pessoas. Dezoito estão foragidas. No domingo, o Tribunal de Justiça negou habeas corpus a todos os suspeitos, segundo o G1.
A reportagem teve acesso ao relatório policial, de duas mil páginas, sobre a investigação iniciada em setembro, com monitoramento de telefonemas e e-mails. Um dos suspeitos, por exemplo, revoltado por ter sido condenado a prestar serviços comunitários, diz que mataria um PM ao final da Copa. De acordo com o documento, uma ação de guerrilha, com uso de bombas de fragmentação, coquetéis molotov e ouriços, estava sendo articulada para marcar a final da Copa do Mundo, dia 13, no Maracanã. O ato vinha sendo preparado para marcar o “Junho negro”.
O trabalho aponta a ativista Elisa Quadros Pinto Sanzi, a Sininho, como principal articuladora do grupo, que teria à frente da comissão de organização a professora de filosofia Camila Rodrigues Jourdan, que, de acordo com conversas captadas, participou da confecção de coquetéis molotov e ouriços. Num diálogo de 28 de junho passado, ela não esconde a revolta com o fato de PMs terem apreendido 178 ouriços e 20 bombas escondidos numa bolsa numa área de vegetação da Praça Saens Peña, na Tijuca. O material seria usado num protesto naquela tarde. “Foram três dias de trabalho jogados fora. Perdemos tudo, é isso?”, pergunta Camila ao interlocutor. Indignada, ela se desentende, em ligações, com Igor D’Icarahy e Rafael Caruso, a quem chama de irresponsável.
Na primeira fase da operação, policiais encontraram gasolina e pedaços de pano usados como estopim de coquetéis molotov na casa de Camila. Já na residência de Igor, foram achadas três bombas caseiras.
EXPLOSIVOS ESCONDIDOS EM BOLSAS
Para tentar evitar que explosivos e ouriços fossem descobertos em revistas feitas por PMs, o grupo passou a esconder o material em bolsas deixadas no entorno dos pontos marcados para os protestos. A estratégia foi descoberta graças a interceptações e à colaboração de ex-integrantes do grupo, insatisfeitos com o aumento do vandalismo e dos ataques a PMs — tática dos black blocs.
Entre as 38 testemunhas que depuseram, 11 eram ex-integrantes do grupo. Foram os relatos desses dissidentes que ajudaram a Delegacia de Repressão a Crimes de Informática (DRCI) a chegar ao organograma da quadrilha, que responde na Justiça por associação criminosa, cuja pena vai de um ano a três anos de prisão, mas pode ser aumentada com os agravantes. Caso de Fábio Raposo e Caio Silva e Souza, presos desde fevereiro, acusados da morte do cinegrafista Santiago Andrade, atingido por rojão durante protesto.
Essa morte afastou alguns integrantes do bando, mas era tratada com ironia por outros. Numa gravação, David Paixão — que na época da investigação ainda era menor e agora, que fez 18 anos, deve ser incluído na denúncia — diz ter acertado um coquetel molotov num PM: “Viu, acertei o cara do Choque. Saiu até na televisão. Agora vão dizer que vândalos adoram matar um Santiago”. Classificado como um dos mais agressivos adeptos da tática black bloc, foi David que disse, segundo testemunha, que mataria um PM. A análise das conversas mostra ainda que eles sabiam que estavam sendo monitorados. Por isso, passaram a chamar coquetéis molotov de “pisca-pisca” ou “drinques”; bombas de “livros”; e ouriços de “canetas”.
AGÊNCIAS BANCÁRIAS QUEBRADAS
O relatório cita a participação dos suspeitos em diversos atos de vandalismo, entre eles o incêndio de um ônibus na Avenida Rio Branco, no Centro. O grupo também é acusado de queimar uma patrulha da PM na Glória. Há ainda o depoimento de uma ex-integrante do bando, que relata uma ordem dada por Sininho para que manifestantes ateassem fogo à Câmara dos Vereadores. A ativista também teria determinado ataques a garagens de ônibus durante a greve de rodoviários em maio passado. Na ocasião, 500 ônibus foram depredados. Numa agenda encontrada em sua casa, havia uma lista com os endereços das garagens atacadas por black blocs.
Na abertura da Copa do Mundo, dia 12 de junho, manifestantes explodiram uma bomba no metrô e quebraram uma agência bancária em Copacabana. Três dias depois, vandalizaram um banco em Vila Isabel, queimaram lixeiras e arremessaram coquetéis molotov. À frente do grupo estariam Gabriel da Silva Marinho e Karlayne Moraes da Silva Pinheiro, a Moa, que numa das escutas diz precisar de “líquido” (gasolina): “Já tá tudo pronto para fazer os drinques, falta só o líquido, mas isso a gente resolve no posto de gasolina”. Em sua casa, policiais encontraram um galão com cinco litros do combustível.
Reprodução Cidade News Itaú via O Globo
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