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segunda-feira, fevereiro 17, 2014

Termina primeiro dia do júri dos réus do massacre do Carandiru

Choque entra no Carandiru na tarde de 2 de outubro de 1992 (Foto: Arquivo Diário de S.Paulo)No primeiro dia da terceira etapa do julgamento de policiais militares e ex-policiais militares envolvidos no episódio que ficou conhecido como massacre do Carandiru, que
resultou na morte de 111 detentos do presídio da Zona Norte de São Paulo, em 2 de outubro de 1992, apenas duas testemunhas de acusação foram ouvidas. O júri terminou por volta das 18h40 desta segunda-feira (17). Desta vez, 15 réus estão sendo julagados pela morte de oito presos, além de outras duas tentativas de homicídio.
O júri, que teve início na manhã desta segunda-feira no Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste de São Paulo, corresponde ao terceiro bloco de réus, que seriam os policiais que, naquela ocasião, atuaram no 3º andar do Pavilhão 9 do presídio, o que equivale ao 4º pavimento.
Por conta do número de réus, a Justiça desmembrou o caso em quatro partes ou júris diferentes, correspondentes aos andares invadidos. O critério é julgar o grupo de policiais militares que esteve em cada um dos pavimentos onde presos foram mortos.

O júri é presidido pelo juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, com os promotores Márcio Friggi e Eduardo Olavo sendo responsáveis pela apresentação das acusações contra os réus. A defesa está sendo feita pelo advogado Celso Machado Vendramini.
Neste primeiro dia, além da escolha dos jurados, todos homens, foram ouvidas duas testemunhas de acusação: o perito Osvaldo Negrini Neto e o diretor de disciplina do presídio Moacir dos Santos.  O ex-detento Marco Antonio de Moura, que seria a terceira testemunha de acusação a ser ouvida nesta segunda, não pode comparecer e acabou dispensada pela Promotoria. Outras três testemunhas de acusação não foram localizadas para comparecer ao júri.
O advogado de defesa dos réus, Celso Vendramini, afirmou que, ao término do primeiro dia de júri, que o "Ministério Público está exacerbando na acusação, pois, segundo ele, não há provas contra os seus clientes. Inclusive, demonstrou confiança na possibilidade de que as acusações contra eles sejam retiradas.
“Eu acredito que seja retirado tudo. Porque é um absurdo acusar sem prova. A acusação que pesa contra esses PMs é que eles teriam atuado no 3º andar, que é 4º pavimento. Não existem sequer lá marcas de tiros na parede.Não se pode julgar as pessoas sem um laudo de confronto balístico por inércia do Estado. O setor de criminalística não tinha material para fazer os exames na época. Não foi feito a balística dos projéteis retirados dos corpos  da vítima com as armas dos PMs. Como vai acusar alguém assim? como vai saber quem matou quem?”, indagou.

O júri será retomado às 10h30 desta terça-feira (18), com o depoimento de duas testemunhas de defesa. Em seguida, começam a ser ouvidos os réus. Ao todo, estavam previstos os depoimentos de 11 testemunhas, sendo seis de acusação e cinco de defesa. A previsão de duração do julgamento é de uma semana, segundo a assessoria de imprensa do TJ. Um quarto júri está previsto para ocorrer março deste ano.

Testemunhas de acusação
Por volta das 15h10, começou a ser ouvido o perito Osvaldo Negrini Neto. Assim como havia relatado em outros julgamentos do Carandiru, já que o caso foi desmembrado em quatro partes, ele voltou a relatar a grande quantidade de sangue que encontrou nas escadas quando entrou no pavilhão 9. "Eu percebi que o líquido que descia da escada era sangue e em grande quantidade, fiquei impressionado", disse.
Na ocasião em que esteve a primeira vez no presídio, horas depois do massacre, chegou a contar 89 corpos com marcas de tiros que estavam agrupados em um pequeno saguão. "Mais de 95% das marcas de tiros estavam dentro das celas, como se alguém estivesse na porta atirando para dentro", afirmou.
De acordo com Negrini, a maioria dos tiros foram dados de fora para dentro das celas com metralhadoras e pistolas. Ao todo, foram contados mais de 300 buracos de balas em todos os pavimentos. Foram recolhidos vestígios para a elaboração de exame de perícia que constatou a presença de chumbo. Não foi encontrado nenhum projétil, como ocorre nos disparos de revólver.
Apesar disso, o laudo sobre a perícia realizada no terceiro andar, conhecido como quarto pavimento, que corresponde ao local em que atuaram os réus que estão sendo julgados, apontou terem sido localizados poucos vestígios. "Não havia nem 10% dos vestígios que haviam sido encontrados nos outros pavimentos. No quarto pavimento havia vestígios de tiros em apenas uma cela", afirmou.
Questionado por que não foi feito o confronto balístico, Negrini disse que não era possível. "Não foi feito porque não havia equipamento suficiente para fazer. Cerca de 400 projéteis em 500 armas. A opinião dos colegas é que levaria 72 anos", afirmou. Ele explicou por que não esteve no 4º pavimento no dia. "O Pavilhão 9 estava sob o comando da PM até que a situação se normalizasse."
O depoimento do perito aposentado durou cerca de uma hora e 40 minutos. A sessão foi interrompida por alguns minutos e retomada com o testemunho do ex-diretor de disciplina do Carandiru, Moacir dos Santos.
Ele relatou que, devido a uma briga entre facções de presos, foi preciso chamar a Polícia Militar porque os detentos "iriam se matar". Ele afirmou que os detentos estavam munidos de paus e pedras apenas, e que nenhum deles tinha arma de fogo. Santos relatou também que, ao perceber que os detentos estavam sendo executados pelos policiais militares, eles começaram a anotar os nomes dos presos que eram recurtados para recolher os corpos das vítimas para que eles também não fossem fuzilados. "A gente boma e em seguida uma rajada (de arma de fogo). Daí, a gente percebeu que estava fuzilando os presos", afirmou.
Primeiro júri
Outros dois julgamentos relacionados ao Massacre do Carandiru já foram realizados, com condenação de parte dos réus. No primeiro, em 21 abril do ano passado, 23 policiais militares foram condenados pela morte de 13 presos. A pena foi de 156 anos de prisão para cada um, mas eles recorrem em liberdade. Três dos 26 réus que eram julgados foram absolvidos. A sentença foi lida pelo juiz José Augusto Nardy Marzagão, que presidia o júri.
As absolvições foram pedidas pelo promotor Fernando Pereira da Silva, que também solicitou aos jurados que desconsiderassem duas das 15 vítimas inicialmente previstas no processo. Segundo ele, esses detentos foram mortos por golpes de arma branca, o que pode significar que foram assassinados pelos próprios presos. Por isso, os 23 PMs foram condenados por 13 mortes.
Segundo júri
No dia 3 de agosto do ano passado, outros 25 policiais e ex-policiais militares foram considerados culpados de homicídio qualificado e responsabilizados por 52 mortes, sendo sentenciados a 624 anos de reclusão em regime inicialmente fechado. A sentença foi lida pelo juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo.
"Houve inequívoco abuso de poder", disse o juiz em sua sentença. Os réus, porém, puderam recorrer da sentença em liberdade. Os policiais também perderam o cargo público ainda em exercício, mas essa decisão só vai valer depois de julgados todos os recursos.
À época do massacre na Casa de Detenção, na Zona Norte da capital, os réus integravam as Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), tropa de elite da Polícia Militar. Lá dentro, eles teriam efetuado mais de 300 disparos no segundo andar, terceiro pavimento, do Pavilhão 9.
O júri havia sido determinado com 29 réus. Dois deles, no entanto, morreram, um passou por avaliação de sanidade mental e outro respondeu a processo separadamente. Os policiais respondiam inicialmente por 73 mortes. Durante o julgamento, porém, o promotor Fernando Pereira pediu que os réus respondessem por 52 mortes.
Massacre
Os julgamentos do massacre no Carandiru ocorrem mais de 20 anos após a invasão na Casa de Detenção, na Zona Norte de São Paulo. A ação terminou com a morte de 111 presos após a Polícia Militar entrar no Pavilhão 9 para controlar uma rebelião.
Antes destes júris, desde 2 de outubro de 1992, somente um acusado havia sido julgado: o coronel Ubiratan Guimarães. Ele foi condenado em 2001 a 632 anos de prisão, em júri popular, por ter dirigido a operação. Em 2006, o júri foi anulado pelos desembargadores do TJ. Meses depois da absolvição, Ubiratan foi morto a tiros no apartamento onde morava, nos Jardins. O processo do Carandiru tem ao todo 57 volumes, 111 apensos e 50 mil páginas.

Reprodução Cidade News Itaú

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