Crimes financeiros através do esporte não são novidades. Entretanto, há pouquíssimos estudos sobre o assunto publicados mundialmente. Um deles (e talvez o
mais completo até hoje) é o “Money Laundering through the Football Sector” (ou em tradução livre: Lavagem de dinheiro através do setor futebolístico), publicado em 2009 pela FATF (Financial Action Task Force).
De acordo com este relatório, futebol é o esporte mais propício à lavagem de dinheiro e evasão divisas no mundo, devido a sua grande popularidade e a alta soma de dinheiro que é movimentada entre seus diversos “atores” (clubes, jogadores, agentes, eventos, patrocinadores, mídia, empresas privadas e públicas, etc).
O estudo aponta para três motivos que tornam o futebol um ambiente perfeito para crimes financeiros:
1) Estrutura de gerenciamento:
O mercado é muito fácil de ser penetrado pois além de ser muito vasto, com ramificações em todo o mundo, inclusive em paraísos fiscais, é em sua maioria gerenciado por amadores ou pessoas vindas de diferentes áreas de negócios.
2) Complexidade financeira:
O relatório da FATF diz que as transferências de jogadores entre países têm “caráter irracional” já que atletas são propositalmente supervalorizados, inflacionando a balança comercial dos times. Diferente do que ocorre em outros negócios, não existe no futebol uma tabela de preços específica para controlar os gastos e os ganhos dos clubes, os quais vivem em constante débito financeiro.
3) Cultural:
De acordo com a FATF esta é uma vulnerabilidade que dificilmente é vista fora do futebol, já que é uma das poucas áreas de negócios em que o criminoso melhora também seu “status social”. Tanto jogadores quanto dirigentes, agentes e empresas investem no esporte para ganhar respeito da população e de grandes empresários e políticos, elevando-os a um nível de “herói” e/ou socialite que dificilmente outra atividade comercial pode propiciar.
Motivos
A lavagem de dinheiro no futebol ocorre por motivos que vão muito além de objetivos financeiros, fazendo com que dirigentes se esforcem a trabalhar para que a imagem do esporte não seja denegrida, pois isso pode custar a perda de patrocinadores que querem ter seus investimentos relacionados às “boas práticas” do futebol.
Por outro lado, há um motivo bem simples do porquê de muitos clubes continuarem a existir, embora trabalhem constantemente no “vermelho”: justificar resgates financeiros. A partir do momento em que um clube apresenta altos débitos, o mesmo é obrigado a receber investimentos a qualquer custo, não se preocupando com a verdadeira fonte do dinheiro investido, o que facilita a entrada de criminosos no setor.
E esta é uma prática que não se limita somente ao Brasil. De acordo com o relatório anual da Deloitte sobre o mercado do futebol para a temporada 2011/2012 da Premier League, na Inglaterra, somente oito clubes do total de 20 na competição conseguiram atingir lucro após o fim do campeonato, embora a Premier League tenha atingido uma receita de 2,8 bilhões de Libras na temporada e um balanço financeiro positivo de 4 milhões de Libras.
A Fifa tem apresentado várias propostas para combater crimes financeiros no futebol, mas a realidade é que diante da magnitude do esporte e de uma fragilizada estrutura tanto comercial quanto empresarial, dificilmente o mercado da bola deixará de ser uma verdadeira máquina de lavar dinheiro sujo.
O autor
André Munhóz Pinto, que assina este artigo, formou-se pela Universidade Metodista de São Paulo e atuou no Brasil como repórter da rádio Eldorado (hoje rádio Estadão). Também foi editor-chefe das revistas Autosom & Tuning, HotMotors e GrandPrix, todas no setor automotivo. De 2007 à 2009, André trabalhou como jornalista esportivo pela rádio SBS na Austrália, e há quatro anos atua na área de comunicação corporativa na Europa, onde mora na cidade de Praga, na República Tcheca.
Reprodução Cidade News Itaú
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