Em meio a um surto de hepatite, a cidade de Manari, no Sertão Pernambucano, é um dos seis municípios com piores índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM) do país que não aderiu ao programa Mais Médicos, do governo federal, segundo cruzamento de dados feito pelo G1.
Com 18 mil habitantes, a cidade tem o pior IDH de Pernambuco. O G1 foi até o município, onde encontrou postos de saúde onde não há médicos todos os dias, informações de mortes de crianças até um ano de idade e uma escola onde 14 crianças haviam contraído hepatite A.
A coordenadora interina da Atenção Básica de Saúde, Marília Carla de Oliveira, afirmou que "não existe a necessidade de solicitar [Mais Médicos]". "Profissionais a mais não fariam diferença, pois a escala de médicos da saúde básica está completa", diz ela.
Depois que a equipe de reportagem havia retornado do município, a secretária de Saúde, Sibele Monteiro, se manifestou em nota. Segundo ela, "o município ainda não aderiu ao Mais Médicos pois estávamos negociando com os brasileiros mesmo". O programa é aberto a inscrições de profissionais brasileiros e formados no exterior. "Mas como está difícil encontrarmos, estamos pensando, sim, em aderir ao programa", informou.
Para o atendimento básico, a Secretaria Municipal de Saúde afirma que existem três médicos para quatro postos, mas que serão construídas mais quatro unidades.
Segundo a secretária, no entanto, o Ministério da Saúde poderia ajudar mais o município “na liberação de equipamentos, remédios, exames”. Sobre o surto de hepatite, ela diz que todos os casos estão sendo acompanhados por equipes de saúde da família e que aguarda laudos sobre possível contaminação da água no povoado.
Atendimento
A agricultora Maria Santina da Silva, de 65 anos, mora no povoado Alto Vermelho, em Manari, afirma sofrer de pressão alta, mas não conseguiu atendimento médico em razão da fila na Casa de Saúde João Paulo II, em janeiro. "Tive que viajar para Tupanatinga [a 38 km de distância] em carro fretado", diz. Segundo ela, dos 17 filhos que teve, apenas cinco sobreviveram. “Dos que morreram, só um chegou a fazer um ano, por causa das dificuldades”, relata.
Manari tem um dos piores índices de mortalidade infantil do país: 41,1 crianças que não vão sobreviver ao primeiro ano de idade a cada mil nascidas vivas. A média brasileira é de 16,7.
Josefa Edivânia de Oliveira afirma que, em março deste ano, sua filha foi levada do Alto Vermelho para a sede de Manari e também não recebeu atendimento médico.
“Tive que pagar um carro para levar a gente na cidade de Itaíba [a 22 km] e também não tinha médico lá. Aí, a gente foi para Tupanatinga e tinha. Deu R$ 80, de ida e volta”, disse a mãe. A criança de quatro anos tinha vermes.
No posto de saúde do povoado Serra do Exu, perto de Alto Vermelho, a demanda mensal é de cerca de 1.400 pacientes para atendimento com a enfermeira, o técnico de enfermagem, seis agentes de saúde e uma recepcionista. A médica e a cirurgiã-dentista não atendem às sextas, e faltam materiais para restauração dentária e maca para exame de citologia.
No povoado Cercadinho, também em Manari, o posto de saúde só é frequentado pelo clínico geral às quartas e quintas, e o cirurgião-dentista tem expediente às quintas e sextas. No local, só a recepcionista foi encontrada. O técnico de enfermagem estava de folga, mas chegou à unidade para atender a um paciente.
A secretária de Saúde disse na nota que os profissionais devem cumprir a carga de 40 horas semanais, mas que "infelizmente a nossa realidade é essa, pois, devido ao difícil acesso, ou aceitamos as propostas ou ficamos sem profissionais". Sobre o material, a pasta disse haver no estoque, mas que não foi solicitado pela profissional, e que a maca já foi solicitada ao fornecedor.
Surto
Em Cercadinho, 14 crianças foram infectados por hepatite A na Escola Municipal Nilo Coelho, perto da unidade de saúde local. A doença é transmitida pela água e por alimentos contaminados.
“O médico disse para separar banheiro, cama, panos, roupas, copos, pratos, colher, tudo. E lavar as comidas”, afirma Benedita Aristeia da Silva, mãe de sete filhos — a menina de 10 anos é tratada há 45 dias com a doença. “Um bebê meu, de oito meses, morreu em 1999 pelo mesmo problema”, diz a dona de casa.
Benedita Aristeia diz que os agentes de saúde não costumam dar orientações sobre cuidados caseiros e não realizam visitas com frequência. Eles apenas verificariam o peso e a altura das crianças, conta.
Segundo a Coordenação de Atenção Básica de Saúde de Manari, o município é coberto por 42 agentes de saúde, dentro dos padrões do governo federal.
Anailde Maria da Silva, agente de saúde, também teve um filho infectado pela hepatite. O menino, de cinco anos de idade, recebe tratamento há 20 dias. Ela diz que procurou o médico do posto de saúde. “Não existe higiene. É uma coisa que o município deve tomar conta”, diz ela sobre a escola do povoado.
Uma das suspeitas era de que a água da cisterna da escola estaria contaminada. Segundo José Damião da Silva, assistente administrativo da escola, a água é tratada com cloro, coada e fica no freezer durante um dia antes de ir para o bebedouro. “Temos o maior cuidado com a água das crianças. Se tiver problema é com a Compesa”, afirmou.
Por meio de nota, a Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) informa que faz análises da água semanalmente e não tem conhecimento do fato, mas que uma equipe deverá averiguar a situação do local.
A coordenadora interina da Atenção Básica de Saúde de Manari, Marília Carla de Oliveira Martins, afirma que está acompanhando o quadro de perto e diz que a Vigilância Sanitária foi informada.
O resultado dos testes, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, indica que a água da escola não foi infectada e que o vírus está no reservatório de uma casa do povoado. Mais testes serão realizados em outros pontos, informou o órgão.
Reprodução Cidade News Itaú
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