Milton Nascimento poderia comemorar os 50 anos de carreira, completados em 2012, com um show reunindo seus grandes sucessos. Pois foi isso o que ele fez, e o resultado é "Milton Nascimento - Uma Travessia", DVD e CD duplo com 23 canções.
Mas a aparência de obviedade é espantada, primeiramente, pela criação, por parte do próprio cantor, de novos arranjos para o repertório.
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"As músicas são como novas para mim", assegura. "Acho que elas não têm idade. Nem eu. Tenho a idade que as pessoas que estiverem me assistindo e ouvindo achem", diz Milton, 70 anos.
O segundo aspecto antimonotonia é que ele encontrou brechas para incluir duas ou três composições menos conhecidas. Uma delas é a indignada "Promessas do Sol", joia do disco "Geraes" (1976) que ele chama de "música tipo indígena", reflexo de sua convivência à época com artistas latino-americanos.
"Havia ditaduras em praticamente toda a América Latina. Trabalhávamos quase sem poder, escondidos", explica.
Outra é "Lilia", tema instrumental feito para sua mãe --que o criou, pois a biológica morreu quando ele tinha dois anos-- e lançado no histórico "Clube da Esquina" (1972).
A música não tem letra, justifica Milton, porque não há palavras à altura da mulher com quem mantinha, segundo diz, relação de telepatia. Dentre os exemplos que dá, está o do momento em que parou de beber, no final da década de 1970.
"A ditadura não me deixava viver direito, cismavam comigo. Passei quase 20 anos bebendo, porque não via mais o que fazer. Um dia, estava de carro, no Rio, e vi um monte de pessoas na praia, tudo colorido, e percebi que não fazia parte daquele mundo. Na hora pensei: 'Essa ditadura não merece que eu me mate'. E decidi: 'Vou parar de beber hoje'. Fiquei três dias trancado no quarto, deitado na cama, e saí quando percebi que minhas mãos não tremiam e eu não estava tonto", conta, antes de chegar em Lilia.
"Às 4 e meia da manhã peguei o carro e fui para Três Pontas [a cidade mineira em que cresceu]. Quando entrei na casa dos meus pais, minha mãe falou para eu ir com ela no pomar. Na infância, eu tinha plantado uma laranjeira que nunca deu laranja. Nesse dia, havia duas laranjas lá. Minha mãe falou: 'Foi porque você parou de beber'. E eu não tinha contado nada para ela."
AMIZADE
O show do DVD, gravado em outubro de 2012, contou com dois amigos de longa data: Wagner Tiso e Lô Borges.
"Gosto muito de música, mas o principal para mim é a amizade", ressalta ele.
Na polêmica sobre as mudanças na lei de arrecadação e distribuição de direitos autorais pelo Ecad, seus amigos se dividiram. Ele ficou próximo de Gil, Caetano e Chico, na defesa do aumento do repasse dos direitos a autores e titulares. E contrário a Fernando Brant e Ronaldo Bastos. "Não quero saber de briga. Isso vai passar, tem que passar. Estamos todos no mesmo campo, precisamos da mesma coisa", diz.
Reprodução Cidade News Itaú
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