O Brasil, por ser país-sede, está garantido na Copa-14 sem necessidade alguma de participar de eliminatórias. Quando o assunto é arbitragem, porém, não há nenhuma certeza de que haverá um trio brasileiro entre os 32 que apitarão o Mundial.
O primeiro derrotado pelos testes físicos da Fifa foi o paulista Wilson Luiz Seneme, de 42 anos. O segundo foi o gaúcho Leandro Pedro Vuaden. A esperança e a responsabilidade estão com o mineiro Sandro Meira Ricci, da federação pernambucana, que será avaliado em abril, em Assunção, no Paraguai.
Ricci pega pesado na preparação para estar em forma na hora do teste. A participação do Brasil no quadro da arbitragem no Mundial em casa depende dele. Os próprios assistentes, que já passaram nos testes, dependem dele. Só em trio o país pode ter representantes na Copa.
E a parte física é o que mais dificulta aos árbitros brasileiros. Mesmo entre os mais celebrados. Seneme é muito respeitado entre seus colegas. Guilherme Ceretta de Lima, também árbitro paulista, conta que há um neologismo criado para definir o seu estilo. "Ele está sempre em cima do lance e sabe se impor aos jogadores. Quando um árbitro faz tudo certo, a gente diz que ele senemeou naquele jogo, é como se o cara tivesse gabaritado em um vestibular".
O reconhecimento é o que sobrou para Seneme, que não passou nos testes para 2014 e não terá outra oportunidade de apitar um Mundial, pois a Fifa limita a 45 anos a idade de seus árbitros. "Não tenho nada que reclamar. Sempre soube como seriam os testes e sempre soube que, se não passasse, ficaria de fora. Não houve supresas", diz, antes de lamentar a falta de profissionalização da arbitragem brasileira.
"Sou funcionário público estadual aqui em São Carlos, cuido da organização de Jogos Abertos e Jogos Regionais. Não é possível me dedicar apenas à arbitragem, não fiz uma preparação física ideal. Teria de ter começado aos 30 anos para passar agora, com 42. Pelo menos, fui reprovado na pista e não no campo", diz.
O teste não é fácil. Os árbitros precisam dar 20 tiros de 150 metros em 30 segundos cada um. Após um tiro, eles caminham mais 50 metros para o local da nova largada. Também tem 30 segundos para caminhar esses 50 metros. Então, se fazem um tiro de 150 metros em 25 segundos, passam a ter cinco segundos a mais de descanso. Independentemente de conhecimentos técnicos, Usain Bolt seria aprovado com louvor.
Seneme, não. No primeiro teste, realizado em setembro de 2011 em Zurique, na Suíça, ele deu apenas um tiro. "Estava sofrendo de fascite plantar, dores na sola do pé e fui reprovado. Em janeiro de 2012, em Assunção, consegui dar 12 tiros e parei. O teste é muito duro. É mais difícil do que para se manter no quadro da Fifa, que tem um descanso de 35 segundos, que ajuda muito", diz o árbitro.
Vuaden, que era o "reserva" de Seneme, também foi reprovado. Já os bandeirinhas Emerson Augusto de Carvalho e Alessandro Rocha foram aprovados. "Para mim, foi fácil. Fiz mais do que era necessário", diz Emerson Augusto de Carvalho. Ele se refere a 40 tiros de 75 metros, em 15 segundos cada um, no máximo. O descanso entre um tiro e outro é de 20 segundos.
Nem sempre os testes foram tão duros. Até 2002, os árbitros selecionados precisavam dar dois tiros de 150 metros, com 35 segundos de descanso e, em seguida, submeter-se ao teste de Cooper, correndo no mínimo 2.700 metros em 12 minutos. Em 2004, Angel Maria Villar, presidente da federação espanhola de futebol, assumiu a arbitragem da Fifa e pediu ao belga Werner Hensen que mudasse os testes. E, para as Copas de 2006 e 2010, os árbitros selecionados tiveram de dar 24 tiros de 150 metros, com um descanso de 35 segundos para caminhar os 50 metros.
Agora, em 2014, a quantidade de os tiros e de descanso diminuíram. Ao contrário do que possa parecer, ficou mais difícil. "São menos tiros, mas o descanso é bem menor. Esses cinco segundos a menos são terríveis", afirma Seneme.
A escolha dos árbitros brasileiros para a Copa não passa pela CBF. "A Fifa decide tudo, ela nem nos consulta", diz Aristeu Fagundes, ex-presidente da comissão de arbitragem, que deixou o no final de fevereiro de 2013, e, que que, como assistente, participou da Copa de 2006.
"Não posso dizer que me sinto triste porque dois árbitros nossos já foram eliminados, porque assumi em agosto de 2012 e não posso ser responsabilizado. O que eu sei é que a partir de 2013 todo árbitro brasileiro convidado para um curso, um congresso ou um torneio fora do país só comparece se for aprovado em um simulado realizado por aqui".
Aristeu explica que, mesmo que Sandro Meira Ricci ou Heber Roberto Lopes, seu reserva, forem aprovados, não é certeza de participação brasileira. "São aprovados 54 trios, que passam por análises detalhadas em quatro competições (Mundial sub-17, Mundial sub-20, Mundial Interclubes e Copa das Confederações). Só então, são definidos. Há uma tendência de o país-sede ser contemplado, mas não há uma certeza".
Paulo Camello é designado pela CBF para acompanhar o trabalho dos árbitros. "Os árbitros selecionados pela Fifa para fazer os testes recebem um caderno de encargos para se prepararem. Há uma série de exercícios que devem fazer antes dos testes e também de competições. Não deu certo para o Seneme e para o Vuaden e eu sofri muito com eles. Fizemos de tudo, mas como não há profissionalização no Brasil, os árbitros precisam se virar, precisam buscar um tempo extra para treinar. Fica na mão deles. O Sandro Meira Ricci está seguindo tudo o que a Fifa pede e ainda contratou um profissional particular muito bom. Ele vai passar", afirmou.
Enquanto se prepara para o teste, Sandro Meira Ricci é proibido de dar entrevistas. Aristeu permitiu - antes de sair do cargo - apenas que Roberto Patu, seu preparador físico, falasse com a reportagem. "O Sandro vai passar fácil. Ele não começou seu trabalho agora, temos uma parceria que começou há três anos, quando tinha algumas lesões. Hoje, além de árbitro, ele é um atleta", afirmou Patu.
Reprodução Cidade News Itaú
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