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quarta-feira, janeiro 30, 2013

Entreguei-os para Deus quando saíram para a boate, diz mãe que perdeu dois filhos no incêndio


Elaine Gonçalves, mãe de Gustavo Gonçalves, comparece ao enterro dele no cemitério ecumênico de Santa Maria (RS). O jovem teve 70% do corpo queimado e não resistiu aos ferimentos. Na última segunda-feira (28), Elaine enterrou outro filho, Deivis Gonçalves, também vítima do incêndio na casa noturna

"Eu entreguei eles para Deus na hora em que saíram para a boate", diz a doceira Elaine Gonçalves, 61, mãe de Gustavo e Deivis Marques Gonçalves. Os dois irmãos morreram em consequência do incêndio da boate Kiss --Deivis no mesmo domingo (27) da tragédia, Gustavo agonizou com 70% do corpo queimado e teve morte encefálica nesta terça-feira (29) no Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre.

O velório dele, a vítima número 235 da tragédia de Santa Maria, começou com a chegada do caixão na capela 5 do Hospital de Caridade. A mãe procurava confortar os irmãos e os amigos, demonstrando firmeza, mas o tempo todo com estava com o rosto lavado de lágrimas. "O calor está me matando" era sua única queixa, além do lamento pela morte dos filhos.

"Ela é uma mulher guerreira", elogia o cunhado --que não quis ter o nome publicado. Dona Elaine assumiu um papel informal de porta-voz dos pais ao perder dois filhos no intervalo de dias, celebrizada pela dor em rede nacional.

Hoje, no velório, ela recontou seu drama: "Gustavo queria ir para a boate, mas eu disse que ele deveria reunir os amigos aqui em casa, como fez no aniversário dele dia 16". Mas, Gustavo queria a festa na Kiss e a vontade do filho prevaleceu. Ela não se opôs: "Eu sei como é ser jovem, eu também fui festeira".

A mãe conta que "não sei o que foi que meu deu, mas aquela noite eu não peguei no sono logo. Estava vendo TV, não tive nenhum palpite, nada. Antes de dormir, entreguei meus filhos ao Senhor, numa oração, como sempre faço".

A mãe vai repetindo a história para quem chega nos fundos da capela 5, onde passa momentos à sombra. Amigos entram e saem o tempo todo. Ela vai mudando de assunto –ao mesmo tempo, comanda tudo. São delas todas as decisões sobre o enterro. "Agora nós temos que seguir em frente", diz, resignada, enquanto abraça a filha Daniele.

"Eu quero a Justiça de Deus, porque meus filhos saíram de casa banhadinhos, arrumadinhos, bonitinhos, não é justo comigo nem com os outros pais que eles voltem mortos".

Ela ainda alterna momentos de dor com sorrisos, quando conforta os amigos dos filhos, integrantes do piquete de cavalarianos Ari Gonçalves --um piquete é uma versão dos CTGs (centro de tradições gáuchas), do qual Deivis era fã. A mãe dos rapazes disse ainda que o pior momento de sua vida foi "saber que meu filho Deivis morreu". Àquela dor ela somou a da morte de Gustavo: "Dois golpes destes podem matar uma pessoa".

A mãe contou que foi acordada por um telefonema da filha apenas às 9h do domingo (27). "Ela me disse que os meninos não tinham voltado da Kiss e eu não pensei nada", relembra.

Quando a filha falou do incêndio, ela não aceitou a realidade: "Fomos procurar por eles. Só lá pelas 16h achamos o Deivis, no ginásio municipal (entre os mortos). E quando encontraram o Gustavo, no hospital, eu achei que teríamos sorte".

A família Gonçalves não teve sorte. Gustavo estava em estado grave, com queimaduras em 70% do corpo. Ainda no domingo ele foi um dos primeiros transferidos para Porto Alegre, para o centro de referência de queimados do Hospital de Pronto Socorro: "Não pude ir com ele porque tinha que ficar para o enterro do Deivis", diz dona Elaine.

Ela para de recontar seu drama para encarar o momento final de Gustavo. Às 16h, a funerária começa a levar o caixão para o Cemitério Municipal. A capela 5 e o saguão explodem em palmas às 16h02. Cerca de 100 pessoas mantêm a homenagem por quase um minuto.

No Cemitério Ecumênico, Elaine carregou as flores e liderou a última caminhada de Gustavo. Ele estava num caixão com a bandeira do Grêmio, seu time favorito.

Reprodução Cidade News Itaú

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