terça-feira, outubro 23, 2012

Às vezes nem o médico sabe a origem do remédio usado no hospital, diz especialista sobre surto de meningite nos EUA


As autoridades sanitárias americanas confirmaram que os remédios contaminados relacionados a uma série de casos de meningite continham, efetivamente, o fungo causador da infecção que causou mortes
Quando o filho de Julie Auslander ficou doente e não conseguia tomar suas pílulas, a mãe recorreu a um farmacêutico, que manipulou adesivos com o medicamento para o menino. Alguns anos mais tarde, quando a mãe de Auslander não conseguia engolir os ansiolíticos que precisava tomar após uma leucemia, a filha recorreu novamente ao farmacêutico, que preparou um tablete especial que se dissolvia sob a língua da paciente.

Em ambos os casos, Auslander, uma empresária de 53 anos de Montvale, Nova Jersey, examinou de perto o trabalho da farmácia de manipulação.

"Quis saber como tudo era feito, assim como com qualquer outra coisa que compro", afirmou. "Não sou capaz de fazer o mesmo trabalho do FDA, mas só de ver as condições do lugar, posso ter uma ideia do que estou comprando."

Mesmo que a maioria das pessoas compre antibióticos ou remédios para combater o diabetes diretamente nas farmácias, algumas receitas precisam sem misturadas ou alteradas – um processo conhecido como manipulação –, para se adaptarem às necessidades individuais.

Medicamentos feitos apenas para adultos geralmente são manipulados para crianças, ou transformados em chicletes ou líquidos com aroma de uva. Fórmulas sem corantes ou glúten podem ser feitas para pacientes com alergias; remédios com sabor de frango ou peixe podem ser manipulados para gatos e cachorros. Praticamente todos os hospitais com unidades de terapia intensiva possuem farmácias de manipulação que preparam medicamentos para os pacientes.

Entretanto, um grande lote de analgésico injetável manipulado por uma farmácia de Massachusetts estaria contaminado com um fungo que causou uma epidemia de meningite em muitos Estados. Ao menos 15 pessoas morreram e mais de 200 estão doentes. Ainda que, nos Estados Unidos, as farmácias de manipulação sejam regulamentadas por órgãos estaduais, cujos padrões variam, o episódio renovou o debate sobre a falta de regulamentação do setor e das diversas farmácias que se transformaram em pequenas indústrias farmacêuticas.

Quando os médicos prescrevem remédios manipulados em escala ambulatorial, os pacientes geralmente são indicados diretamente a uma farmácia capaz de realizar o pedido, mas muitos deles não sabem que estão recebendo medicamentos manipulados.

"As bolsas para administração intravenosa que ficam ao lado dos leitos – não todas, mas grande parte – são manipuladas na farmácia do hospital", afirmou Anne Burns, vice-presidente sênior de assuntos profissionais da Associação Americana de Farmacêuticos. Os agentes quimioterápicos administrados em clínicas ou consultórios médicos também são manipulados para se adaptarem às necessidades e ao peso dos pacientes, afirmou. "Como em um hospital, quando pacientes recebem remédios manipulados dos médicos, provavelmente não sabem o que estão tomando", afirmou Burns.

Com frequência, até mesmo os médicos de hospitais não sabem de onde os remédios vieram, se foram comprados em farmácias de manipulação ou de grandes laboratórios, afirmou Michael Carome, diretor interino de pesquisa médica no observatório Public Citizen.

O surto de meningite demonstra que os pacientes precisarão começar a perguntar sobre a fonte dos medicamentos que recebem, afirmou.

Segundo os especialistas, a manipulação é apropriada desde que a fórmula tenha sido preparada especificamente para o paciente, com base na prescrição médica, contendo medicamentos aprovados pelo FDA e que não estejam à disposição no mercado.

Mas o centro de manipulação de Massachusetts parece ter agido antes como uma indústria farmacêutica não regulamentada. O analgésico manipulado, um esteroide que pode ser injetado na espinha dorsal, foi enviado para 23 Estados e administrado a mais de 14.000 pacientes.

"A produção de mais de 17.000 unidades do esteroide deixou claro que o centro estava agindo fora de seu escopo de atuação", afirmou Marcus Ferrone, professor adjunto de farmacologia clínica na Universidade da Califórnia, em São Francisco, e diretor do Drug Products Service Laboratory, que manipula medicamentos e dá cursos para estudantes de farmácia.

Outro sinal de que algo estava errado era a data de validade dos medicamentos nos frascos. Fotografias publicadas na mídia mostram que a data de validade impressa em alguns dos frascos era seis de fevereiro de 2013.

"A indústria farmacêutica gasta muito tempo para determinar as datas de validade, mas as farmácias de manipulação não podem fazer isso", afirmou Ferrone. "Não temos acesso a esse tipo de informação."

Ferrone não quis fazer comentários específicos sobre o medicamento que causou o surto, mas afirmou que produtos estéreis de alto risco utilizados em injeções dorsais e nutrição parenteral "recebem um prazo de validade de apenas 24 horas".

O farmacêutico afirmou que os pacientes devem questionar "não apenas se o medicamento foi manipulado, mas se todos os procedimentos são feitos no mesmo local". Segundo ele, caso o medicamento seja manipulado em outro lugar, a próxima questão deveria ser: "Quem supervisionou a produção e os procedimentos de qualidade do fornecedor externo?".

Os pacientes precisam ficar especialmente ligados com os medicamentos administrados por via intravenosa ou injeção, pois devem ser preparados sob condições estéreis.

Ainda que o trato gastrintestinal possua mecanismos para combater bactérias e outros contaminantes, "mas quando são injetados diretamente no sistema circulatório, há menos opções", afirmou Cynthia Reilly, diretora da divisão de desenvolvimento de práticas da Sociedade Americana de Farmacêuticos do Sistema de Saúde.

Reilly e outros especialistas ofereceram mais alguns conselhos a respeito dos medicamentos manipulados.

– Pergunte a seu médico se o medicamento precisa de manipulação e, caso precise, pergunte por que e se existem medicamentos aprovados pelo FDA que possam ser adquiridos diretamente nas farmácias – mesmo que sejam mais caros. Caso precise de um remédio específico, escolha a farmácia de manipulação da mesma forma que escolhe os demais fornecedores de cuidados com a saúde. Peça recomendações, mas assegure-se de que o local possui o licenciamento estadual e nunca foi penalizado por irregularidades.

– Questione a respeito da formação dos farmacêuticos e se são credenciados. Vá até a farmácia e conheça as instalações.

– Pergunte ao farmacêutico se ele está habituado a manipular seu medicamento e se já fez isso antes. Peça indicações sobre o armazenamento e a utilização do produto e não se esqueça de perguntar sobre os efeitos colaterais, os riscos e as contraindicações.

– Confira se há notificações pelo não cumprimento de regras no site do FDA. Entretanto, a autoridade da agência sobre as farmácias de manipulação é limitada.

– Evite comprar medicamentos diretamente com o médico e procure utilizar a mesma farmácia para manipular todas as suas prescrições. Se a embalagem do produto não indicar a marca do fabricante e o rótulo não incluir instruções de uso e advertências, o medicamento pode ter sido manipulado. Se receber um produto desse tipo, pergunte ao farmacêutico se o médico pediu para que o medicamento fosse manipulado.

– Fique alerta com a fonte de medicamentos administrados por via intravenosa ou para os olhos. Alguns produtos odontológicos, especialmente géis anestésicos, também podem ser manipulados, assim como muitos analgésicos e medicamentos para a pele.

– Se estiver se submetendo a um procedimento eletivo que exija medicamentos disponíveis apenas por meio de manipulação em função da escassez no mercado, considere adiar a realização do procedimento.

Fonte: Portal Uol/Cidade News Itaú

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