Voltar a ouvir. O Rio Grande do Norte tem se destacado na medicina especializada em tratamento para surdez e tornado real o sonho de muitas pessoas que perderam a audição. O Programa Estadual de Implante Coclear, vinculado ao Sistema Único de Saúde (SUS), já realizou em solo potiguar 592 cirurgias. Isso com uma técnica de intervenção cirúrgica que, no Brasil, há 12 anos, só era feita em São Paulo. Graças à vanguarda norte-rio-grandense, pacientes daqui e de estados vizinhos voltaram a ouvir e falar. Melhor: de graça. O governo paga por cada cirurgia cerca de R$ 47 mil. Também é possível fazer a cirurgia de forma particular, ao custo de R$ 52 mil.
O implante coclear é um dispositivo eletrônico instalado no ouvido interno, ou cóclea, que tem o objetivo de substituir o ouvido humano. "Ele capta o som e o transforma num sinal elétrico que o sistema nervoso entende. É uma conversão de energia acústica para a elétrica. O aparelho reproduz a mesma coisa que nosso ouvido interno realiza quando o som chega, nesse caso, transformando energia acústica em energia elétrica", explica Rodolpho Penna Lima, otologista responsável pelo programa no RN. A tecnologia pode ser a solução esperada por pessoas que nasceram surdas ou que adquiriram a surdez durante a vida.
Saliente-se: não estamos falando de cura. "A pessoa continua com a deficiência auditiva, mas reabilita plenamente a audição e a fala", ressalta Penna Lima, lembrando que para ouvir, é preciso estar com o aparelho ligado, e retirá-lo quando for dormir ou tomar banho. "Somos pioneiros no país, referência nacional", diz o médico. Foi através dessa técnica que o estudante cearense Aronaldo Júnior, 9 anos de idade, voltou a ouvir. O garoto teve perda total da audição aos 9 meses de idade após uma meningite que calcificou seu ouvido interno. "Após a meningite, percebemos que ele não ouvia o barulho do chuveiro, nem quando a gente batia palmas", conta o pai, o locutor de rádio José Aronaldo Lima.
A família mora em Saboeiro, cidade do interior do Ceará distante 500 quilômetros de Fortaleza, e o diagnóstico foi feito com o exame Bera, na cidade de Iguatu (CE). Há sete anos a família do menino decidiu trazê-lo para fazer tratamento na capital potiguar. A cirurgia foi feita em 2005. Hoje Aronaldo mantém uma vida normal. Vai à escola como qualquer criança, brinca, se diverte. Periodicamente volta à capital para avaliação do aparelho, exames de rotina e consultas com a equipe multidisciplinar. "Ele próprio é quem marca as consultas. É como se tivesse nascido para o mundo depois da cirurgia", diz a assistente social que acompanha a criança, Andrea Mesquita. "Graças a Deus está tudo normal. Só tenho cuidado para que meus colegas não mexam no meu aparelho", fala Aronaldo, ex-surdo.
Primeira reação ao ouvir
Um grande sorriso. Esta foi a primeira reação de Aronaldo Júnior, quando tinha 6 anos de idade e foi ligado o aparelho do implante em seu ouvido interno. "É uma reação comum. Ele riu. As crianças sorriem quando a gente liga o aparelho. Já pessoas mais velhas normalmente se emocionam quando voltam a ouvir. Choram muito", relata a assistente social Andrea Mesquita. A reação que teve o funcionário público municipal Luiz Nunes da Silva, 64 anos, foi o choro. Natalense, ele também fez a cirurgia de implante coclear e voltou a ouvir após perder a audição ao longo da vida.
Atualmente ele tem voz e escuta como qualquer pessoa sem deficiência. Também é um ex-surdo. "Sempre digo às pessoas que têm problemas de audição que procurem fazer o tratamento. Você fica novinho em folha. Hoje com 64, me sinto um cidadão de 18 anos", comemora Luiz Nunes. Andrea Mesquita contou que uma das recomendações que faz às famílias de pessoas que recebem o implante é evitar fazer gestos, justamente para estimular o paciente a ouvir e falar. "O apoio da família é fundamental. A de Aronaldo fez isso e hoje percebemos o quanto foi importante. Ouve e fala como uma criança qualquer", destaca a assistente social.
No RN, SUS paga sete cirurgias por mês
Referência na área, atualmente o Rio Grande do Norte realiza um simpósio nacional que recebe médicos de todo o Brasil. Este ano o evento acontece entre 29 de agosto e 1º de setembro. No entanto, o único porém para que o programa seja ainda mais abrangente é que o SUS financia apenas sete cirurgias por mês aqui no Estado. Segundo o médico responsável pelo programa, Rodolpho Penna Lima, dá para administrar a demanda sem deixar ninguém sem assistência porque há outras técnicas de tratamento e nem todos os pacientes precisam fazer a cirurgia. Aqui em Natal apenas o Hospital do Coração realiza o procedimento, através do SUS ou via convênio com planos de saúde e particulares. Já o atendimento e acompanhamento é feito na Clínica Otomed, no Tirol, também conveniada ao SUS.
O implante coclear surgiu nos Estados Unidos há quase quatro décadas. Os primeiros implantes eram rudimentares. Aqui no Brasil a cirurgia é feita há 34 anos. A primeira foi em Bauru, interior de São Paulo. Desde então a técnica vem se aperfeiçoando. Hoje, além da intervenção propriamente dita no ouvido, uma equipe multidisciplinar acompanha o paciente antes e após a cirurgia. Além do cirurgião e otologista, a equipe é composta por assistente social, fonoaudióloga, médico otorrinolaringologista e, no caso do implante de tronco, ainda há a participação de um neurocirurgião. "Recebemos pacientes do país inteiro", diz Lima.
A Agência Nacional de Saúde (ANS) incluiu o implante no rol de procedimentos. Através de uma pequena incisão de três centímetros atrás da orelha, a cirurgia consiste na introdução de um feixe de eletrodos dentro da cóclea do paciente, como é chamado pelos médicos o ouvido interno do ser humano. "Esse feixe de eletrodos estimula o nervo auditivo e as terminações nervosas do ouvido. A cirurgia dura em média uma hora e meia, com anestesia geral. Após fazer a cirurgia, em 30 dias o aparelho é ligado. Então, o paciente é levado à reabilitação com fonoaudiólogo", explica o médico Rodrigo Penna Lima.
Além do aparelho ao redor da orelha, alguns pacientes precisam usar um suporte com a base do equipamento nas costas. É mais indicado para crianças, que podem machucar o implante se a bateria for acoplada ao aparelho por fora do ouvido e houver alguma pancada. Arovaldo Júnior, por exemplo, já danificou seu aparelho. O pai conta que o menino entrou na piscina sem retirar o suporte nas costas. "Ele também sente vergonha às vezes. Não tira a camiseta em público", relatou Arovaldo Lima.
As crianças têm um desempenho melhor no tratamento porque comprovadamente já se sabe que a melhor época para o desenvolvimento da fala e da audição é aos três anos de idade. "Por isso buscamos fazer a cirurgia o mais precocemente possível", diz o Rodolpho Penna Lima. Já um adulto totalmente surdo leva uma média de quatro ou cinco anos para retomar a normalidade da voz e da audição. "Após esse período a pessoa pode se considerar habilitada. Nos casos de adultos que já tinham audição e que perderam por algum motivo, o resultado é ainda mais eficiente: em seis meses ele estábom. Estamos falando da mais moderna e mais eficiente técnica de reabilitação auditiva", resume o médico.
Outras tecnologias
Além do implante coclear, existem outras tecnologias tão eficientes quanto para fazer surdos voltarem a ouvir. Uma delas é o implante auditivo tronco-cerebral, que difere do implante coclear apenas pelo local onde se colocam os eletrodos. "É usada nos casos em que a pessoa nasce sem a cóclea ou não tem nervos auditivos. Nesse caso um feixe de eletrodos é implantado na base do cérebro", destaca o médico RodolphoLima. Nesse caso, o RN também se destaca.
Fonte: DN Online/Cidade News Itaú
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