Seis delegados da Polícia Civil
do Rio Grande do Norte, um agente da Polícia Federal e um servidor aposentado
da Assembleia Legislativa foram denunciados pelo envolvimento com assassinatos,
tráfico de entorpecentes, formação de quadrilha, corrupção e tráfico de
influência. A maior parte deles ocupa ou já ocupou cargos do alto escalão da
Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social do RN. A
investigação começou a partir de um ofício de solicitação feito pela
Presidência da República.
O processo de investigação foi
aberto oficialmente na semana passada, por determinação da Delegacia Geral de
Polícia Civil (DEGEPOL) do RN, que é responsável pela administração da
instituição no RN. O trabalho é realizado pelos delegados João Bosco
Vasconcelos de Almeida, Laerte Jardim Brasil e Marcus Dayan Pereira Teixeira de
Vasconcelos. A denúncia, no entanto, chegou oficialmente ao conhecimento do
Governo do Estado em agosto do ano passado.
De acordo com o ouvidor da
Defesa Social do RN, Geraldo Soares Wanderley, responsável pela apuração de
violação dos direitos humanos na Secretaria de Segurança do RN, o pedido de
apuração foi feito pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, que é vinculada
à Presidência da República.
Segundo Wanderley, o documento
foi encaminhado em nome do Sindicato dos Policiais Civis e Servidores do Itep
(SINPOL) do RN e por isso foi recebido - se fosse sem assinatura, não seria
recebido. O conteúdo, no entanto, é anônimo e conseguiu "driblar" a
Secretaria Nacional de Direitos Humanos, que recebeu e pediu medidas à
Ouvidoria do RN.
O Sindicato dos Policiais Civis
emitiu nota ontem à tarde, negando qualquer vínculo com as denúncias, que são
gravíssimas. A direção da instituição fez questão de negar a autoria do texto e
lembrar que a denúncia configura um crime, já que não tem identificação.
O caso veio à tona no domingo
passado, com uma reportagem publicada pelo jornal Tribuna do Norte. O veículo
teve acesso ao conteúdo da denúncia contra seis delegados da Polícia Civil, um
agente da Polícia Federal e um servidor aposentado da Assembleia Legislativa do
RN. O texto traz o nome e alguns dos crimes que teriam sido cometidos por cada
um dos denunciados, que vão de tráfico de drogas, assassinatos, extorsões e
vários outros.
São denunciados os delegados:
Ronaldo Gomes de Moraes, Sheila Maria Freitas de Almeida, Sílvio Fernando,
Gustavo Santana, Delmontiê Falcão e Márcio Delgado Varandas; o agente federal
Sílvio Marcelino Júnior, que trabalha na Secretaria de Segurança do RN; e
Admilson Fernandes, funcionário aposentado da AL/RN.
Documento sugere investigação
‘de fora’
Uma tríplice comissão foi
designada para apurar as gravíssimas denúncias feitas contra membros da alta
cúpula da Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social do RN em
caráter especial. Os responsáveis são delegados da Polícia Civil, assim como a
maioria dos denunciados. No documento, o autor da denúncia já previa essa
possibilidade, alegando prejuízos para a efetividade de tal procedimento.
"Toda e qualquer
investigação a ser realizada sobre os fatos acima expostos, jamais poderá ser
feita pela polícia do Rio Grande do Norte, pois os policiais citados fazem
parte da cúpula das polícias civil, militar, PF e da Sesed, inviabilizando e
tornando suspeita toda e qualquer apuração", recomenda o denunciante,
segundo trecho reproduzido pelo jornal Tribuna do Norte no domingo.
O próprio ouvidor da Defesa
Social do RN, Geraldo Soares Wanderley, concorda que o ideal era uma
investigação totalmente desvinculada da Secretaria de Segurança do RN.
"Eles (os delegados que estão investigando) ficam numa situação delicada.
Têm que investigar seus próprios colegas", diz.
Apesar do posicionamento,
Wanderley faz questão de ressaltar a confiança nos três policiais designados
especialmente para apurar essas denúncias. "São três profissionais sérios,
mas é um caso complicado", explica o ouvidor, que ao ser questionado sobre
quem deveria investigar, não consegue formular resposta para o caso.
Pelo menos quatro instituições
são afetadas diretamente, segundo matéria da Tribuna. As polícias Civil,
Militar e Federal e a Assembleia Legislativa do RN são citadas.
A denúncia cita relações com o
tráfico de drogas, onde delegados teriam apreendido e depois revendido
entorpecentes, há também casos de envolvimento direto ou indireto com
assassinatos, extorsão, corrupção e diversos outros crimes.
Texto destaca força dos ‘Veras’
na Polícia
O documento anônimo fala também
sobre crimes ocorridos na região Oeste do Rio Grande do Norte com participação
direta ou indireta das forças policiais potiguares. Os crimes seriam cometidos
a mando de membros da família Veras, que é bastante influente na região e teve
alguns dos seus integrantes alvo de investigações, como Antônio Francisco
Nóbrega Martins Veras, ex-prefeito de Campo Grande, morto em março de 2010.
O delegado que investiga a
chacina que vitimou Antônio Veras e os policiais Jackson Cristino Dantas e
Solano Costa de Medeiros, seguranças do ex-prefeito, é Márcio Delgado Varandas,
que foi designado em caráter especial para investigar o caso e continua à
frente do inquérito, três anos depois.
Márcio é um dos seis delegados
acusados pelo documento de fazer parte do esquema que favorecia a família
Veras.
"Desde o ano de 2005 que
várias mortes vêm acontecendo na Região Oeste sem que ninguém investigue a
fundo os autores", destaca a reportagem, reproduzindo trecho da denúncia.
Mais adiante, a matéria usa outro trecho: "é sabido dentro das
instituições policiais que muitas destas mortes foram arquitetadas pela Família
Veras com a participação de policiais civis e militares".
O documento cita o nome de
algumas pessoas que foram assassinadas na região, com a participação direta ou
indireta de policiais, a mando de membros da família Veras, como José Reis de
Melo, que era réu confesso no assassinato dos irmãos Vicente e César Veras,
irmãos do ex-prefeito morto.
Só com a briga entre as
famílias Veras e Reis, dezenas de pessoas teriam sido mortas de forma
extremamente violenta ao longo das últimas décadas.
Entidades citadas cobram
investigação
Ontem as entidades citadas
direta ou indiretamente como participantes de um gravíssimo esquema
posicionaram-se sobre as denúncias. Em suma, todos foram contra a reportagem,
que foi pautada por uma denúncia anônima, mas manifestaram interesse numa
investigação séria sobre esses fatos.
A Associação dos Delegados de
Polícia Civil do Rio Grande do Norte (ADEPOL) divulgou texto repudiando a
reportagem, alegando que seus representados foram expostos publicamente,
através de uma denúncia feita anonimamente.
A Depol concorda com a abertura
de procedimento investigatório, mesmo fruto de denúncia anônima "por
entender que é da natureza do serviço público prestar informações e
esclarecimentos para que não pairem dúvidas sobre a idoneidade e o trabalho de
cada um".
"Os delegados citados na
reportagem têm relevantes serviços prestados à sociedade, mesmo assim tiveram
os nomes expostos perante a opinião pública com base numa denúncia anônima e
sem a existência de nenhuma acusação oficial", reclama a direção da
Adepol.
Por fim, a nota manifesta
confiança na comissão que foi designada para investigar as denúncias, mesmo
sendo composta por colegas de trabalho dos policiais denunciados.
O Sindicato dos Servidores do
Departamento de Polícia Federal no Estado do Rio Grande do Norte também se
manifestou, apoiando o agente Silvio Marcelino da Silva Júnior, citado pela
reportagem.
A entidade faz questão de falar
dos serviços prestados pelo policial e que ele "não infringiu quaisquer
normas que regem a carreira do policial federal, sendo portador de uma conduta
ilibada perante a sociedade potiguar", diz a nota.
Já a Secretaria da Segurança
emitiu resposta desqualificando a procedência das denúncias, atribuindo-as a
"mudanças que ocorreram, no ano passado, em cargos na Delegacia Geral de
Polícia Civil (DEGEPOL), podem ter desagrado algumas pessoas, que teriam ficado
chateadas, passando a promover tais denúncias, com o intuito de causar tumulto
na instituição".
Mesmo assim, a Secretaria diz
que está sendo feita uma investigação. "O caso está sendo investigado por
meio de processo administrativo e de inquérito policial".
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