Como em seus trabalhos anteriores, Padre Fábio de Melo compila em seu novo disco ao vivo músicas que nada têm a ver com religião. "No meu interior tem Deus", como o título faz supor, traz como temática canções sobre o interior do Brasil.
Estão lá versões como "'Disparada" (de Geraldo Vandré e Theo de Barros), "Tocando em frente" (Almir Sater e Renato Teixeira), e "Vida marvada" (Rolando Boldrin).
"É uma trilha sonora que ajuda a viver", define, em entrevista por telefone ao G1. Durante o bate-papo, ele também conta que tem o costume de chorar ao ouvir músicas e ver filmes, como no mais recente dirigido por Woddy Allen. "Fiquei emocionado durante 'Meia-noite em Paris'. Aquilo ali é uma metáfora muito interessante para quem escreve. Meus heróis sempre foram escritores", revela.
G1 - O senhor usa o termo 'música secular' para canções não religiosas?
Padre Fábio - Acho o termo pretensioso. Eu tenho respeito por tudo o que é arte. Não gosto de chamar as canções de seculares, reconheço sacralidade que não encontro em músicas religiosas. São letras com valores humanos, questões fundamentais, que a modernidade nos privou de conhecer.
G1 - É mais facil ter fé por meio não só da música, mas da repetição de mensagens, de versos? Os refrões são usados nesse sentido pelo senhor?
Padre Fábio - A religião não pode perder seu ofício de aliviar o fardo, a existência. É uma trilha sonora que ajuda a viver, é o objetivo do homem que evangeliza. Ajuda as pessoas a serem melhores. Eu experimento isso. Trabalho com música há 16 anos. Muito mais do que criar um mantra, oferemos músicas que causam um bem estar e uma possível mudança de estado de espírito. A palavra pode fazer bem e mal. Não quero me limitar a cantar uma música religiosa, cantar hinos. Estou cada vez mais comprometido a um trabalho de arte com uma mudança antropológica, para sermos mais solidários, amorosos.
G1 - Isso acontece não só com os discos, mas com filmes também?
Padre Fábio - Às vezes vamos ao cinema e saímos bem. Todo o discurso religioso tem que fazer pensar. Precisamos quebrar paradigmas, descobrir que existe uma inadequação. É saudável fazer isso diariamente, quebrar o cotidiano. É bom você se surpreender com alguma coisa, algo que mostrou que não sabe tanto assim. A arte tem a natureza de te posicionar de um jeito novo. Religião que não faz isso aliena.
G1 - O que ouvia quando criança?
Padre Fábio - Cresci ouvindo modas de viola tocadas pelo meu pai. Ele foi músico como eu sou, tinha intuição musical e não estudou. Ele chorava quando ouvia música bonita. Ele sabia tocar a música com a emoção. É a grande herança que ele me deixou.
G1 - Qual a última vez que chorou ouvindo música?
Padre Fábio - Ontem. Eu me emociono muito. Eu estava ouvindo uma música da Mônica Salmaso, "Senhorinha". Fazia tempo que não ouvia.
G1 - Qual o último filme que viu? Chorou?
Padre Fábio - Eu fiquei muito emocionado durante "Meia-noite em Paris". Aquilo ali é uma metáfora muito interessante para quem escreve. Meus heróis sempre foram escritores. Eu tive dois encontros que me marcaram: com a poetisa Helena Kolody [1912-2004] e quando tomei um café com Adélia Prado. Foi parecido com a dinâmica do filme. Há quatro anos, compus "Humana voz de Deus" para ela.
G1 - Já pensou em seguir carreira na política?
Padre Fábio - Eu já ouvi propostas mas não tenho vocação e disposição. Eu não seria um bom administrador, não tenho capacidade. Eu sofreria muito, minha sensibilidade não permitiria. Não aguentaria o tranco de uma vida política.
G1 - Bozo Barretti, que tocou muito tempo com o Capital Inicial, é seu diretor musical e tecladista. Há algo de Capital nos seus shows e discos?
Padre Fábio - Quando eu fiz a primeira reunião com o diretor do DVD, Serginho Bittencourt, foi o primeiro nome que veio. Eu sabia que ele tinha competência. Conheço o trabalho dele no Capital, mas não o conhecia. O Bozo trouxe um pouco de modernidade para o antigo. As canções são formas antigas de comunicar, mas tem a leveza da música popular brasileira do Bozo. Sempre gostei de Capital Inicial, da roupagem da música. Uma das preocupações é que às vezes a música diz uma coisa e o arranjo diz outra. O desafio do arranjador é colocar a roupagem certa. Eu gosto de arranjador que lê a letra.
Fonte: G1
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